Campus e Comunidade

Um retorno bem realista ao IV Seminário de Estudos Associativos de 1968

Além de um cenário muito similar ao da altura, a viagem no tempo foi propiciada pelos testemunhos de vários participantes ativos do marcante evento associativo.

Cinquenta anos depois, o mesmo cenário e com alguns dos principais intervenientes. Foi assim que a Associação dos Estudantes do Instituto Superior Técnico (AEIST), com a colaboração da Associação Cultural Ephemera e do Técnico, decidiu recordar o IV Seminário de Estudos Associativos de 1968. A piscina, hoje em dia inativa, não serviu de palco como outrora, mas o ambiente do evento estudantil foi recriado na perfeição e serviu como “pano de fundo”, para o debate pleno de recordações que decorreu esta quinta-feira, 7 de junho. Esta foi a segunda iniciativa de um vasto leque de eventos sobre estes anos agitados do Movimento Estudantil que a AEIST está a organizar.  Contando com a moderação de António Armando da Costa, o debate inicial foi protagonizado por  Alberto Costa, Jorge Almeida Fernandes, Jorge Veludo e Paula Fonseca, todos ex-dirigentes do Movimento Estudantil e ativos participantes no IV Seminário de Estudos Associativos.

A audiência, grande parte dela composta por elementos desse mesmo Movimento, antigos alunos do técnico e de outras escolas, não precisava com certeza de um enquadramento histórico, mas ainda assim o moderador da sessão fez questão de o fazer. “Esta importante realização das Associações de Estudantes foi aberta a todas as academias com o objetivo estratégico de reforçar as capacidades de luta do movimento estudantil contra a repressão da ditadura, pela sua ligação à luta das populações, pelos seus inalienáveis direitos sociais e políticos, e pela democratização da sociedade portuguesa em geral e da universidade portuguesa em particular”, referia António Armando da Costa. Lembrando o “caráter repressivo do regime fascista contra as associações de estudantes” que atingira níveis elevadíssimos à data, com a imposição por parte do regime “de uma organização interna contrária aos seus interesses”, a que se juntaram outros factos graves contra os estudantes, despoletavam, como frisou moderador, a “necessidade de uma profunda reflexão interna”. E foi neste sentido, e com objetivos bem definidos,  que se avançou para o IV Seminário de Estudos Associativos, no qual  foram submetidas mais de 100 moções que mostravam o imenso trabalho de participação, e a que mais um milhar de estudantes aderiu. “Foi uma grande realização promotora dos valores democráticos entre os estudantes, fomentou a sua prática na atividade associativa e foi por isso mesmo uma grande escola de formação democrática”, concluía o moderador, arrancando um estrondoso aplauso à audiência.

“Estive aqui há 50 anos, para um trabalho intenso de alguns meses”, recordava Jorge Almeida Fernandes, estudante da Faculdade de Direito, e um dos coorganizadores do IV Seminário de Estudos Associativos. “O José Eduardo Freire – um dos principais autores desta ideia- teve uma conversa comigo onde me explicou que o movimento associativo estava muito débil, as direções estavam muito isoladas dos estudantes, que havia uma geração nova, o mundo mudara muito e isso refletia-se dentro da universidade”, recordava o orador. Relatando o papel que lhe fora atribuído, frisou que o trabalho preparatório, envolveu imensa gente e muitas dinâmicas. Não se pretendia que se assumisse apenas como um “simulacro de debate”. “As pessoas discutiam, apresentavam moções, propostas, havia uma comissão de redação que dava forma às ideias, discutia-se e votava-se”, referiu ainda.

Também sobre os objetivos e os resultados do IV Seminário se debruçou Jorge Veludo, na altura vice-presidente para as relações externas da AEIST. “Eu acho que no Técnico nós conseguimos em grande medida mobilizar os estudantes para a estrutura bastante forte da AEIST”, frisou.  “O trabalho da comissão organizadora foi notável. O resultado não podia ser mais benéfico”, acrescentou de seguida.  Paula Fonseca, uma das 12 mulheres que integraram as várias sessões do Seminário, e também membro da AEIST, por sua vez, além da conjuntura política e social que se vivia, usou a sua curta intervenção para enfatizar “a vontade que as associações tinham de se ligar às populações”.

“Recordar a normalidade de um movimento que continua, que se debruça sobre si próprio e procura encontrar soluções para as dificuldades, isso sim é celebrar o verdadeiro movimento associativo, e não apenas relembrar os movimentos de crise”, referia Alberto Costa, ativo participante no IV Seminário, congratulando-se com a realização deste evento comemorativo. Desvalorizando a sua participação no movimento estudantil, assegurou que “sempre que consegui vir, gostei do que ouvi”. “As ideias preconizadas pareciam amplamente justificadas. A viragem aos cursos era essencial e era preciso vence-la através do interesse dos objetivos pedagógicos e por outro lado a abertura à nação era importante para os jovens”, assinalou posteriormente.

A palavra foi depois dada ao público, cimentando-se aquele que é um dos grandes objetivos destas iniciativas: o repensar do trajeto, propagar memórias, mas essencialmente promover a partilha dos testemunhos daqueles que fizeram as histórias.