Ciência e Tecnologia

A “eletrodinâmica extrema” de estrelas de neutrões e buracos negros – IST Distinguished Lecture

Roger Blandford, astrofísico da Universidade de Stanford, dirigiu a 19 de abril uma palestra sobre “eletrodinâmica extrema em fontes compactas”.

A convite do Instituto de Plasmas e Fusão Nuclear (IPFN) e do Centro de Astrofísica e Gravitação (CENTRA), Roger Blandford conduziu uma IST Distinguished Lecture a 19 de abril incidindo sobre ‘eletrodinâmica extrema em fontes compactas’. A ideia principal desta palestra, segundo o astrofísico da Universidade de Stanford em visita ao Instituto Superior Técnico, é que “a eletrodinâmica, uma das áreas da física mais  bem-compreendidas, está a ser levada para novos territórios pelas observações astronómicas, em particular as feitas a estrelas de neutrões e buracos negros”.

Blandford diz-se muito interessado em compreender como a eletrodinâmica funciona nestes ambientes, assunto ligado não só à física convencional como a experiências laboratoriais, e acedeu em dar uma entrevista no seguimento da sua Distinguished Lecture onde comentou este campo e partilhou experiências passadas e conselhos para o futuro.

 

Quando começaram a ser explorados estes campos mais ‘extremos’?

Roger Blandford (RB): Nos anos 60, com a descoberta dos pulsares, começámos a entrar nestes territórios e, nos anos 70, começámos a perceber que os quasares estão associados a buracos negros e que esses últimos provavelmente seriam fortemente magnetizados. Por isso, diria que é desde essas duas décadas que as pessoas têm ‘manuseado’ estas ideias e tentado compreendê-las. Mais recentemente, sabe-se que os campos magnéticos em torno dos magnetares [(estrelas de neutrões com um campo magnético muito intenso)] são muito mais intensos do que aquilo que pensávamos, por isso talvez nos últimos 10 anos tenhamos entrado nestes terrenos mais ‘extremos’.

 

Que pontos destaca na sua carreira?

RB: Sinto-me extraordinariamente sortudo por ter encontrado algo que me pagam para fazer e do qual gosto genuinamente – isso não acontece sempre [risos] e vou aproveitá-lo enquanto puder. Há algumas coisas nas quais estive envolvido em que propus certos mecanismos ou processos e, mais tarde, outros encontraram provas disso. Isso é sempre gratificante porque já houve alturas em que tentei isso e falhei miseravelmente, não conseguindo calcular aquilo que procurava calcular, ou ninguém conseguiu observá-lo. Dizer “isto é importante e deve ser o que acontece” e depois descobrir que assim é é sempre compensador.

 

Como é que surgiu o seu interesse pela ciência?

RB: Os meus pais não eram do meio científico, mas tive a sorte de ter um professor muito bom no ensino primário. Ensinava-nos muitas coisas para além do necessário para os exames, mesmo não sendo suposto, e uma das coisas que nos ensinava era experiências. Para mim, era magia pura. Ficava pasmado com isso. Consigo lembrar-me dele a fazer estas experiências, sem que nos estivesse a querer ensinar alguma coisa, mas sim a pedir “vejam, observem”. Outra coisa importante foi a biblioteca local, que tinha uma secção infantil muito boa, com muitos livros sobre natureza e outros conteúdos científicos.

 

Na sua opinião, que papel devem as universidades ter na sociedade?

RB: Primeiramente, produzirem estudantes que são competentes e experientes naquilo que será necessário no mundo daqui em diante. Não quero soar apocalíptico, mas acho que o mundo enfrenta muitos desafios e os políticos e líderes de negócios não se estão a safar lá muito bem. Acho que a comunidade científica tem de encontrar uma forma de trabalhar em conjunto, por isso sou muito fã de ver cientistas e universidades a não se encararem uns aos outros como clubes de futebol em competição. Penso que têm de estar mais envolvidos e, em particular, têm de treinar os estudantes para se envolverem mais nos grandes desafios do futuro, e não sei se é necessariamente aí que está o ênfase atualmente.

 

No seguimento disso, que conselhos daria aos estudantes?

RB: Vejo que, em relação aos seus estudos, os alunos estão cada vez mais especializados. Acho que deveriam ser ecléticos, tentando ver o futuro como algo que pertencerá mais aos generalistas que aos especialistas – alguém que, na qualidade de físico, tem uma educação mais abrangente e, em particular, que incida sobre questões reais do mundo contemporâneo. Acho que é disso que vamos precisar e que o mesmo pode ser dito de químicos, engenheiros…

 

O que acha que o futuro da astronomia poderá reservar?

RB: A pergunta com o ‘maior cachet’ na perspetiva do público será, provavelmente, a questão da Vida no Universo e de descobrir se esta é comum ou não. Acho que isso terá implicações enormes. Se descobríssemos que a Vida no Universo é muito comum, acho que isso teria um impacto cultural muito grande.

[Vamos talvez também] encontrar as ‘armas fumegantes’ sobre de onde vêm os neutrinos e os raios cósmicos. As pessoas já observaram estes fenómenos, mas de onde é que eles vêm? Quando os quasares foram descobertos, houve muitas teorias loucas, mas com o tempo as pessoas passaram a dizer “sim, são estrelas de neutrões magnetizadas em rotação – porque é que acharíamos que eram outra coisa diferente disso?”. Acho que isso acontecerá em várias áreas e que acertaremos na maior parte [dessas perguntas].