As sociedades cooperativas são o mote de partida do artigo de uma equipa de investigadores portugueses composta pelos informáticos do INESC-ID Francisco C. Santos, docente do Técnico e Fernando P. Santos , estudante de doutoramento, aos quais se juntou o matemático Jorge M. Pacheco da Universidade do Minho. O trabalho foi publicado na revista Nature, esta quinta-feira, 8 de março,e tem dado que falar . “O tema central do artigo é a evolução e manutenção de cooperação entre humanos, um dos grandes desafios científicos do século XXI”, explica Francisco Santos. Descomplicando os níveis de cooperação na sociedade, o artigo baseado num modelo computacional conclui que as normas sociais simples são capazes de potenciar elevados níveis de cooperação numa sociedade.
O que leva afinal os seres humanos a cooperar uns com os outros? Estratégias individuais e normas sociais têm um peso decisivo na balança cooperativa. “Há normas sociais que são mais eficientes do que outras na promoção da cooperação. Por outro lado, as normas sociais podem ser arbitrariamente complexas e cognitivamente difíceis de compreender”, explica Fernando Santos. Este trabalho estabelece pela primeira vez uma relação entre as normas que caracterizam os julgamentos morais e a sua complexidade e confirma que a reputação dos indivíduos funciona como um estímulo para a cooperação. Esta, por sua vez, é na maior parte das vezes resultado de um mecanismo de “reciprocidade indireta” e que faz com que alguém que ajude melhore a sua reputação, e num futuro tenhas mais hipóteses de ser ajudado.
“Seria expectável que normas mais complexas conseguissem chegar a soluções mais eficientes na promoção da cooperação. As nossas simulações computacionais revelam o oposto, justificando a recorrente simplicidade dos sistemas morais das nossas sociedades”, assinala Francisco Santos. Para chegarem a estas conclusões os três investigadores analisaram 65.536 normas diferentes. Perceberam que uma pequena parte dessas normas (0,2%) é capaz de sustentar níveis máximos de cooperação. Deste estudo pormenorizado resulta a curiosa conclusão de que quem cooperar com ‘os bons’ e não cooperar com os ‘maus’ deve ter uma boa reputação e quem fizer o contrário deverá obter uma má reputação”. E ao contrário do esperado a reputação no passado dos recetores da “doação” não terá grande influência na tomada de decisão. “Os nossos resultados demonstram que não ganhamos nada em manter esse peso do passado. Na realidade, até é benéfico ser lesto a desculpar, recuperando a reputação de quem agiu mal anteriormente, o que nos parece uma conclusão reconfortante”, explica o investigador Francisco Santos.
Um facto curioso que os investigadores também revelam, é que este padrão “ótimo”, como o designam, foi encontrado em recentes trabalhos de investigação de psicologia infantil, com bebés de poucos meses de vida. Isto sugere que o nível simples de moralidade que revelamos quando somos crianças (algo potencialmente inato) pode ser suficiente para suportar níveis altos de cooperação numa sociedade.
As conclusões do artigo científico abrem portas para a conceção de novos sistemas de reputação, otimizando as soluções que encontramos nas plataformas da Internet que são avaliadas por terceiros e acabam por influenciar as nossas decisões e a nossa cooperação e que são cada vez mais uma tendência. Todas estas conclusões inovadoras levam o artigo a integrar a conceituada revista, um facto que deixou os autores “naturalmente muitíssimo contentes”. “Dado o teor multidisciplinar do tópico da evolução de cooperação, será difícil imaginar um sítio mais atrativo para publicar este trabalho. É uma oportunidade fantástica para divulgar mundialmente o trabalho que temos vindo a realizar aqui no Técnico”, acrescentam os dois autores do Técnico.