Um artigo inovador da autoria do antigo aluno do Técnico, Pedro Oliveira, foi recentemente publicado no prestigiado jornal Nature Microbiology. O título do trabalho “Epigenomic characterization of Clostridioides difficile finds a conserved DNA methyltransferase that mediates sporulation and pathogenesis” pode não revelar muito aos mais leigos na área de Microbiologia, mas o seu conteúdo já está a dar que falar na comunidade científica, tendo impacto na problemática questão das infeções hospitalares.
“Este artigo estuda múltiplos isolados clínicos de uma bactéria que se chama Clostridioides difficile (C. difficile), e que é uma das principais causas de infeções ocorridas em meio hospitalar nos países desenvolvidos”, começa por explicar Pedro Oliveira. Por exemplo, só nos Estados Unidos, esta bactéria é responsável por aproximadamente meio milhão de infeções e 30.000 mortes por ano, custando ao sistema de saúde cerca de 5 biliões de dólares por ano. “A transmissão de C. difficile é facilitada através da formação de estruturas dormentes – designados esporos – que são altamente resistentes à maioria dos desinfetantes hospitalares e rotinas de limpeza”, salienta o alumnus do Técnico. O foco do trabalho do grupo de investigação de Pedro Oliveira é o epigenoma de C. difficile – um código secundário que é “escrito” por cima da sequência primária de ADN. “Este epigenoma, ou código secundário, é normalmente ‘escrito’ por um grupo de proteínas denominadas metiltransferases de ADN (MTases)”, sublinha o alumnus do Técnico.
No seguimento deste estudo, que agora ganha destaque na Nature Microbiology, a equipa descobriu que “inibindo uma dessas MTases, a bactéria C. difficile perde muita da sua capacidade em formar esporos, tornando-se menos capaz de se transmitir”, como partilha Pedro Oliveira. “O que é ainda mais emocionante, é o facto de encontrarmos estas MTases em praticamente todas as bactérias atualmente conhecidas”, realça o investigador. O termo emocionante não é usado aleatoriamente por Pedro Oliveira, uma vez que através desta descoberta, e à semelhança do que foi feito com C. difficile, a equipa acredita que a inibição de muitas destas MTases “permitirá diminuir a virulência e patogenicidade de várias outras espécies de bactérias”, como adianta o alumnus.
O trabalho liderado por Pedro Oliveira é o primeiro estudo epigenético feito numa grande quantidade de isolados clínicos, “o que permite tirar conclusões com um nível de detalhe bastante superior”, como o mesmo salienta. A relevância do mesmo torna-se ainda mais evidente tendo em conta a crescente resistência aos antibióticos, uma vez que “a estratégia que propomos neste artigo pode ser encarada como um plano B promissor para combater infeções de origem bacteriana”, refere Pedro Oliveira.
A oportunidade de trabalhar nesta área surgiu enquanto o alumnus do Técnico trabalhava como pós-doutorado no Instituto Pasteur em Paris. Na altura, Pedro Oliveira estava a investigar aquilo que designamos como reguladores do fluxo de informação genética em bactérias, ou seja, sistemas genéticos que regulam a entrada de novo ADN numa célula. “Estes reguladores operam ao nível epigenético, ou seja, utilizam pequenas modificações no ADN para distinguir o ADN que é da célula do que é exterior à célula”, explica. Posteriormente surgiu a hipótese de o antigo aluno do Técnico vir a trabalhar nesta mesma área na Icahn Mount Sinai School of Medicine. “Na altura eles tinham adquirido vários sequenciadores de ADN de última geração que permitiam obter automaticamente informação sobre estas modificações com grande precisão”, contextualiza Pedro Oliveira. “Ao mesmo tempo, sendo um hospital, tinham acesso a múltiplos isolados clínicos de várias bactérias. Ora, estavam reunidas as condições para algo interessante”, acrescenta. “Propus uma linha de investigação com base nesta nova tecnologia e alguns destes isolados clínicos, eles aceitaram, e as coisas acabaram por correr bem”, relembra ainda. Prova disso mesmo são os resultados atingidos e esta honrosa publicação no prestigiado jornal.
Apaixonado pelo seu trabalho, o alumnus do Técnico afirma que uma das coisas que mais o entusiasma no mesmo é “a possibilidade de interagir com cientistas que possuem formações muito díspares – como médicos, biólogos celulares e computacionais, físicos, ou engenheiros – e no fim, traduzir esse esforço cooperativo em algo maior e benéfico para a sociedade”. Para Pedro Oliveira este artigo “foi um primeiro passo”, revelando-nos a sua convicção de que “como sempre na ciência, outros se seguirão”.