Campus e Comunidade

Mais de duas dezenas de atividades do Técnico levaram a ciência à Noite Europeia dos Investigadores

Experiências, jogos e demonstrações aproximaram milhares de pessoas da investigação do Técnico em três espaços.

Sob um tabuleiro de damas improvisado, um grupo de jovens discutia probabilidades enquanto seguia com atenção o movimento das peças. As apostas faziam-se sobre qual chegaria primeiro à meta, em função da soma lançada nos dados. “A dama número 1 nunca chega a avançar”, explicava Rita Soares, do Centro de Análise Matemática, Geometria e Sistemas Dinâmicos (CAMGSD), entre protestos bem-humorados de quem percebia já ter escolhido a peça ‘errada’. O episódio revelou o espírito da Noite Europeia dos Investigadores (NEI), que na última sexta-feira, 26 de setembro, encheu de ciência vários espaços culturais.

Distribuídos por três espaços – o Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MUHNAC), o Pavilhão do Conhecimento e a Marina de Oeiras – milhares de visitantes cruzaram-se com mais de duas dezenas de atividades dinamizadas pelas Unidades de Investigação associadas ao Instituto Superior Técnico, que contaram com jogos, experiências, demonstrações e diálogo direto entre investigadores e público.

No MUHNAC, uma das paragens levava a explorar uma investigação sobre células de cancro em estruturas tridimensionais. “O nosso objetivo é criar, fora do corpo, modelos que permitam testar fármacos e definir regimes terapêuticos adaptados a cada doente, reduzindo efeitos secundários”, explicava Nuno Bernardes, investigador no Instituto de Bioengenharia e Biociências (iBB).

Já no claustro, a qualidade do ar era o mote da discussão. Entre a identificação de poluentes de diferentes meios de transporte e a medição de níveis de oxigénio durante o período de sono, caracterizava-se a importância do impacto ambiental. “Queremos reduzir a pegada carbónica das escolas, mudando a forma como a sustentabilidade é ensinada. É através da educação que conseguimos consciencializar para hábitos mais responsáveis”, sublinhava Tiago Faria, investigador do Centro de Ciências e Tecnologias Nucleares (C2TN).

“É uma noite diferente, em que não estão agarrados à televisão ou aos videojogos”

Já no interior do museu ao Pavilhão do Conhecimento, filas de curiosos aguardavam a sua vez para conduzir um carro a hidrogénio telecomandado. Antes, eram guiados pelas etapas do processo: a produção do hidrogénio por eletrólise da água, o seu armazenamento em cartuchos de hidratos metálicos e, por fim, a aplicação no veículo. “É sempre um momento marcante ver a surpresa das crianças ao conduzir o carro e dos pais ao perceberem que esta tecnologia já é uma realidade”, sublinhou Diogo Santos, investigador do Centro de Física e Engenharia de Materiais Avançados (CeFEMA)

À volta, os biomateriais atraíam a atenção dos mais novos, que associavam compostos a alimentos do quotidiano – do amido da batata às proteínas aplicadas em próteses ósseas. Diana Silva, investigadora no Centro de Química Estrutural (CQE), destacou a centralidade desta interação: “Queremos mostrar como estes materiais são criados e sublinhar que, por trás de uma aplicação clínica, podem estar anos de investigação”.

Logo ao lado, a atividade “Química que salva vidas” desafiava pequenos e graúdos a perceber como a ciência dos materiais pode ser também aplicada à criação de órgãos artificiais. A experiência convidava a recriar ‘membranas’ usadas em tratamentos médicos como a hemodiálise e a ECMO – oxigenação por membrana extracorpórea. “Há impacto no contacto direto com as pessoas, no que partilhamos entre colegas e na abertura para futuras colaborações”, destacou Mónica Faria, investigadora do CeFEMA. “No fim da noite saímos cansados, mas com uma sensação clara de concretização”.

Foi também esta atividade que convenceu Mariza Padilha a ficar, depois de ter sido incentivada pela filha de nove anos. Entre sorrisos, enquanto observava a curiosidade da criança, sublinhou: “É uma noite diferente, em que não estão agarrados à televisão ou aos videojogos. Têm contacto com outras realidades e com a ciência. Mais do que ouvir falar, aqui podem experimentar e perceber, e isso é fantástico”.

“É incrível perceber o que se aprende e ter noção da dimensão da investigação feita em Portugal”

Também a Marina de Oeiras transformou-se numa verdadeira “zona de descoberta científica”, acolhendo famílias de todas as idades interessadas em experiências práticas. Entre as atividades, a construção de pequenos foguetões eletrónicos – orientada por Afonso Gonçalves, estudante do Técnico – atraía grande atenção. “As crianças não param de aparecer. Já fizemos dezenas de foguetões, e é sempre especial vê-los sair daqui com algo feito por eles próprios”, explicou.

Sara Mendes, alumni do Técnico,  trouxe os filhos e considerou a experiência recompensadora. “O foguetão foi a atividade preferida. Eles aprenderam e divertiram-se ao mesmo tempo – valeu a pena o passeio”, sublinhou. Também Joana Cerdeira quis proporcionar esta experiência ao filho de 11 anos: “Ele está fascinado com a ciência desde que começou a ter a disciplina na escola. Aqui pode experimentar na prática, e isso faz toda a diferença”. 

Inês Sardinha, do projeto Oeiras Experimenta, apresentou atividades no âmbito da agricultura sustentável – demonstrando culturas agrícolas mais resistentes à seca, como o sorgo e o chícharo, e convidando os visitantes a experimentar receitas feitas a partir destes ingredientes.

De regresso ao MUHNAC, o Centro de Estudos de Gestão do Instituto Superior Técnico (GEGIST) transformava a gestão de resíduos em jogo de tabuleiro. Os visitantes percorriam um tapete que simulava ruas de uma cidade, percebendo como a recolha inteligente pode tornar-se mais eficiente. João Vieira, que participava pela primeira vez na iniciativa, admitiu que a experiência superou as expectativas e garantiu voltar em próximas edições. Também Ana Miranda, acompanhada pela filha, descreveu o entusiasmo familiar: “Ela quer parar em todas as atividades. É incrível perceber o que se aprende e ter noção da dimensão da investigação feita em Portugal”.

A matemática, muitas vezes vista como abstrata, também se tornou tangível. Com duas cordas, representavam-se números racionais, e os visitantes eram desafiados a explorar diferentes formas de cálculo. “A matemática é mais do que números, tem múltiplas aplicações na vida real”, comentou Isa Marcelino, estudante de licenciatura em Matemática Aplicada e Computação do Técnico, que já havia participado no Dia Aberto do Técnico e defendia a relevância de “iniciativas que despertam a curiosidade desde cedo”.

Na mesma sala, o Centro de Astrofísica e Gravitação (CENTRA) fazia girar um globo iluminado para explicar as estações do ano e as fases da lua. Entre perguntas e observações, os visitantes compreendiam como a inclinação da Terra influencia a duração do dia e a intensidade da luz solar.

“Não queremos que a ciência seja apenas para um nicho”, afirmou Alexandra Franco, comunicadora de ciência no Instituto de Plasmas e Fusão Nuclear (IPFN), quando questionada sobre o valor da divulgação científica. “Aumentar a literacia científica é parte da nossa missão enquanto comunidade”.

No final da noite, entre corredores mais silenciosos e bancas a arrumar os últimos materiais, permanecia a ideia de encontro. “É um exercício interessante aprender a explicar ciência a diferentes públicos. Com as crianças, muitas vezes, a comunicação é até mais simples e divertida”, testemunhou João Senra, doutorando do Técnico no Centro de Recursos Naturais e Ambiente (CERENA). Com as luzes a apagarem-se, ficaram no ar os ecos de perguntas, risos e descobertas – uma lembrança de que, por uma noite, a ciência se fez presente não apenas nos laboratórios, mas também no espaço vivido pelo público.


Lista das unidades de investigação associadas ao Técnico que participaram nesta edição do NEI em Lisboa:

  • Centro de Análise Matemática, Geometria e Sistemas Dinâmicos (CAMGSD)
  • Centro de Astrofísica e Gravitação (CENTRA)
  • Centro de Ciências e Tecnologias Nucleares (C2TN)
  • Centro de Estudos de Gestão do Instituto Superior Técnico (CEGIST)
  • Centro de Física e Engenharia de Materiais Avançados (CeFEMA)
  • Centro de Química Estrutural (CQE)
  • Centro de Recursos Naturais e Ambiente (CERENA)
  • Centro para a Inovação em Território, Urbanismo e Arquitetura (CiTUA)
  • Instituto de Bioengenharia e Biociências (iBB)
  • Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores – Investigação e Desenvolvimento em Lisboa (INESC-ID)
  • Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores – Microsistemas e Nanotecnologias (INESC-MN)
  • Instituto de Engenharia Mecânica (IdMEC)
  • Instituto de Investigação e Inovação em Engenharia Civil para a Sustentabilidade (CERIS)
  • Instituto de Plasmas e Fusão Nuclear (IPFN)
  • Instituto de Sistemas e Robótica de Lisboa (ISR-Lisboa)
  • Laboratório de Águas do Instituto Superior Técnico (LAIST)

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