Ciência e Tecnologia

Química na deteção do cancro: uma investigação que vence prémios

Docente do Departamento de Engenharia Química (DEQ) e investigadora do grupo Chemistry and Toxicology of Bioactive Molecules, Alexandra Antunes recebeu, em dezembro do ano passado, o prémio Long-Range Research Iniciative (LRI) Innovative Science award, pela sua pesquisa na área da deteção precoce de cancro.

Passou pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e pela Universidade Nova de Lisboa… Quando começou a sua ligação ao Técnico?
Eu tive um percurso um bocadinho diferente do que é habitual: ainda não tinha acabado o doutoramento e tive logo um emprego na indústria. Estive a trabalhar na Bial, durante cerca de dois anos e quando decidi que o que gostava mesmo era de estar ligada à academia, vim para o Técnico fazer o pós-doutoramento, em 2004. Saí em 2006 para a Nova, e voltei dois anos depois.

Como foi o seu percurso?
Na verdade eu queria seguir Bioquímica, mas entrei num ano muito conturbado e decidi assegurar a entrada em Química. Acabei por gostar e prossegui essa área, mas na verdade o que eu hoje faço é um ramo da Química muito ligado à Bioquímica.
Depois fez o Mestrado em Química Orgânica e Industrial e o doutoramento em Química Orgânica. Em que trabalha hoje?
Em toxicologia molecular, ligada à toxicologia química: a toxicologia induzida por agentes químicos. Os meus primeiros passos nesta área foram dados ainda no meu mestrado, e depois no pós-doutoramento, mas desde que estou no Técnico é esta a área em que trabalho. Foi mesmo para desenvolver esta área que vim.

O que é que esta área tem de tão interessante?
É a possibilidade de aplicar os meus conhecimentos básicos de Química Orgânica de uma forma bastante direta. Neste momento tenho vários projetos onde, por exemplo, estou a monitorizar doentes. Estou a trabalhar diretamente com os hospitais, monitorizo doentes… A possibilidade de ver a minha ciência completamente aplicada.

Quando decidiu manter-se ligada à academia, arranjou uma forma de se manter ligada à indústria?
Não, é uma aplicação não industrial. Na indústria somos obrigados a fazer a investigação mediante as políticas da empresa. Aqui eu sou completamente livre de escolher o meu caminho, e essa liberdade é uma grande mais-valia.

Recebeu, em dezembro, o LRI Innovative Science award. Quais são as inovações que motivaram este reconhecimento?
O prémio refere-se a um ramo daquilo que estou a fazer. O que tenho estado a fazer é desenvolver aquilo a que chamamos biomarcadores, que são marcadores que nos permitem ligar tanto a exposição do doente ao fármaco, como depois correlacionar a exposição aos efeitos adversos. Se pudermos fazer esta ligação, conseguimos tentar perceber como conseguimos minimizar esses efeitos. Este prémio não é especialmente dedicado aos fármacos, é a agentes químicos no geral, e é muito focado na carcinogénese induzida por agentes químicos.

Pode explicar?
Premeia o desenvolvimento de biomarcadores precoces de cancro (cancro induzido por agentes químicos) e o desenvolvimento de um teste preditivo do poder carcinogénico dos agentes químicos. Para que isso possa acontecer, o que eu vou fazer é explorar uma nova hipótese: monitorizar a interação dos agentes químicos com proteínas chave.

Qual a relevância para o dia a dia?
Não sei se as pessoas no geral têm essa noção, mas a exposição humana a agentes químicos é uma das maiores causas de cancro. Estes novos biomarcadores que estou a desenvolver vão possibilitar fazer a monitorização da exposição humana a um agente químico em concreto, e também vão permitir que se caracterize numa fase muito mais precoce o potencial carcinogénico de cada agente.

Considera que a Química tem um papel fundamental no estudo da prevenção e tratamento do cancro nos próximos anos?
Sim, a Química, a Bioquímica… é nas mãos dos químicos que está muito deste desenvolvimento de terapêutica. E ao nível da prevenção, no campo onde estou a trabalhar… onde não é tão vulgar ver químicos.

Não?
A maior parte das pessoas que trabalham nesta área da toxicologia não são químicos: são bioquímicos. No país, devemos ser o único grupo de químicos que trabalha nesta área.

O que significou vencer este prémio?
Para já, um orgulho imenso. Mas o mais importante foi ter o reconhecimento internacional do valor do meu trabalho. Nos últimos anos tenho batalhado muito para implementar a minha ciência, escrevi mais de vinte projetos, e nenhum foi subsidiado por fundos portugueses. Aliás, este mesmo projeto já tinha sido submetido à Fundação para a Ciência e Tecnologia e foi recusado, portanto…ter vencido foi a validação de todo o meu trabalho.

E na prática?
Em termos internacionais, mais do que o dinheiro, penso que me vai ajudar no networking europeu que é muito importante para lançar a minha carreira internacional. E como é um prémio monetário [vale 100 mil euros], vai possibilitar desenvolver todo este projeto. Vou chamar para trabalhar comigo outras pessoas de outras instituições, sobretudo porque isto é um trabalho de fronteira, e nós não temos no Técnico todas as valências. Vai possibilitar-me criar esta equipa multidisciplinar.