A equipa de João Canário, professor do Instituto Superior Técnico e investigador no Centro de Química Estrutural (CQE), trouxe para Portugal amostras de permafrost – solo permanentemente gelado – com idades entre os 25 e os 100 mil anos, recolhidas no Ártico (em Fairbanks, Alasca, Estados Unidos da América), num trabalho de campo que decorreu no início de abril. O objetivo desta investigação é estimar a quantidade e a origem do mercúrio armazenado em solo gelado na Terra, antecipando algumas das consequências das alterações climáticas.
“Com o aumento da temperatura global, em especial no Ártico, a temperatura do solo aumenta também e o solo, previamente gelado, deixa de o estar”, explica o investigador. Na região explorada, o permafrost é rico em matéria orgânica e, quando descongela, “a degradação microbiana conduz à produção de grandes quantidades de gases com efeito de estufa”. Além do carbono, outros metais pesados como o mercúrio estiveram também ali armazenados e “são agora libertados para os ecossistemas com efeitos adversos na vida selvagem”. Este trabalho permitirá também avaliar os impactos da libertação de mercúrio para o ambiente e propor medidas de mitigação ou remediação.
A equipa – que inclui também os estudantes de doutoramento do Técnico Henrique Zilhão e Diogo Gonçalves – recolheu amostras em lagos que resultam da degradação de permafrost e também num túnel, o Vault tunnel, onde se encontra solo gelado intacto há mais de 100 mil anos. “Este túnel foi construído com o objetivo de minerar ouro e atualmente constitui uma verdadeira máquina do tempo onde podemos ‘recuar’ milhares de anos”, descreve João Canário, que esteve em contacto com raízes milenares e até um crânio desfeito de um mamute.
A idade das amostras recolhidas será determinada com mais precisão também com a ajuda de investigadores do Centro de Ciências e Tecnologias Nucleares (C2TN) do Técnico. Desse modo, será possível relacionar a origem do mercúrio nestes solos com a idade a que o solo gelado se formou. Será ainda possível estimar a quantidade de mercúrio armazenado no solo gelado a nível global.
Em 2023, João Canário liderou a primeira equipa portuguesa a realizar investigação na Gronelândia, em que também recolheu amostras de permafrost. Faz investigação há mais de uma década no Ártico e na Antártica, onde estuda a química da degradação do permafrost e o seu impacto nos ecossistemas boreais e austrais. Juntamente com a investigadora e professora Zita Martins, coordena o Minor em Ambientes Extremos do Instituto Superior Técnico, o primeiro e único do país.