O Campus Tecnológico e Nuclear(CTN) do Instituto Superior Técnico recebeu na passada sexta-feira, 27 de abril, um amplo debate sobre as aplicações médicas das ciências nucleares. O simpósio, organizado pelo Técnico e pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, tinha como intuito assinalar as comemorações dos 60 anos de investigação na área das ciências e tecnologias nucleares em Portugal, mas acabou também por se assumir como a circunstância para vislumbrar e delimitar todos os horizontes futuros subjacentes à temática.
Perante uma plateia repleta de interessados e especialistas da área, coube ao presidente do Técnico, o professor Arlindo Oliveira, a intervenção inaugural, na qual referiu diversas vezes “o fantástico trabalho, com resultados extremamente significantes, desenvolvido neste campus, onde há 57 anos se investiga e trabalha na energia nuclear”. Explicando as diversas e benéficas aplicações na saúde que advêm das ciências e tecnologias nucleares desvendou um pouco do projeto da nova clínica construída de raíz, localizada no CTN, e onde, a partir de 2021 os doentes oncológicos poderão ser tratados de forma mais eficaz e sem efeitos secundários com tecnologia nuclear. Uma ideia que os presentes puderam conhecer melhor através de um vídeo que colmatou a apresentação do presidente do Técnico.
Visivelmente entusiasmado durante a visita que antecedeu o simpósio, o diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atómica(IAEA), Yukiya Amano, fez questão de o salientar na sua apresentação: “estou muito contente por estar convosco aqui, numa instituição com uma enorme e excelente reputação pela alta qualidade de seu ensino e pesquisa”. Num discurso muito abrangente, onde não esqueceu o papel de “Portugal enquanto membro fundador da Agência Internacional da Energia Atómica em 1957 e um parceiro importante em muitas áreas do nosso trabalho”, explicou um pouco do trabalho desenvolvido pela IAEA, cujas atividades “cobrem quase tudo relacionado à ciência e tecnologia nuclear”.
Yukiya Amano não quis, porém, fugir ao tema do Simpósio, e por isso acabou por se debruçar, em grande parte do seu discurso, sobre a temática do cancro: invocou os números assustadores que circundam esta doença que atinge países desenvolvidos, mas também em vias desenvolvimento, onde por sua vez “os serviços de prevenção, rastreio, diagnóstico precoce e tratamento são inexistentes ou totalmente inadequados”, uma realidade que a instituição que comanda esta empenhada em mudar. Por tudo isto, o diretor-geral da IAEA não quis deixar de referir a “ótima oportunidade e as vantagens subjacentes a este projeto português que trará grandes benefícios para pacientes com cancro e melhorará significativamente a capacidade de pesquisa de Portugal neste importante campo”. Um positivismo que posteriormente foi oficializado na assinatura de um memorando assinado pelo dirigente da IAEA e o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, o professor Manuel Heitor, e onde ambas as partes consagraram os objetivos de uma cooperação técnica e trilateral, que incidirá em vários aspetos, mas sobretudo na colaboração para a criação da unidade de saúde e no apoio de Portugal à formação de profissionais de países africanos, sobretudo originários dos Países Africanos de Língua Portuguesa (PALOP), em áreas como a medicina nuclear e radioterapia.
Embora já tivesse intervindo anteriormente para agradecer e questionar o diretor-geral da IAEA, o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, fez questão de assinalar o momento com uma ampla e esclarecedora intervenção. “Hoje é sem dúvida alguma um dia muito importante na ciência nuclear portuguesa”, começou por frisar. Numa época onde temos cada vez mais consciência das “potencialidades das ciências e tecnologias nucleares na cura do cancro, a assinatura deste memorando é um passo muito importante para que façamos parte deste caminho”, referia de seguida o governante. Declarando a “ciência como uma maneira de criar liberdade”, o professor Manuel Heitor não “negou que este projeto é um desafio enorme”, mas que será também com certeza “a abertura de um novo capítulo que trará benefícios a médicos, cientistas, mas sobretudo aos pacientes”.
Aproveitando o momento, o ministro atribuiu ainda algumas medalhas da ciência em reconhecimento do trabalho dos investigadores em ciências nucleares que se distinguiram nos últimos 60 anos em Portugal na área: os professores António Ramalho, José Carvalho Soares, Frederico Gama Carvalho, Carlos Varandas e a professora Maria Fernanda Silva.
E para os que ainda tivessem dúvidas sobre as enormes potencialidades da terapia com protões, seguiu-se uma apresentação do professor João Seco, do Centro Alemão de Investigação do Cancro, e um debate a várias vozes, com a participação de médicos e investigadores que atuam na área em Portugal, onde várias vezes e sob diversas perspetivas se veicularam as potencialidades desta área na luta de uma das doenças mais avassaladoras do século XXI.