Porquê a escolha do dia 17 de setembro para assinalar o Dia Internacional do Microrganismo?
O dia escolhido corresponde à data, do ano de 1683, de uma das cartas enviadas à Royal Society of London por Anton van Leeuwenhoek, um comerciante holandês sem fortuna ou graus universitários mas muito curioso, paciente e dotado de um extraordinário poder de observação. Construiu e desenvolveu centenas de microscópios, aperfeiçoando as lentes do seu sistema ótico, tornando assim possível obter amplificações extraordinárias para a época e observar e descrever, pela primeira vez, as bactérias. Nessa famosa carta, era feita uma primorosa descrição da primeira observação de bactérias vivas presentes na placa dentária, a qual era acompanhada por desenhos dos microrganismos observados e seus movimentos. Foram assim lançadas as bases da Microbiologia na medida em que a vida microscópica passou a ser observável.
Para além do seu significado, esta data não colide com qualquer outro dia comemorativo e foi acordada com a UNESCO de modo a poder vir a tornar-se o Dia Internacional do Microrganismo. Ou seja, o ano de 2017, com esta comemoração no Pavilhão do Conhecimento, poderá vir a ser o ano zero do Dia Internacional do Microrganismo.
Que tipo de atividades foram organizadas nesse sentido, ontem, no Pavilhão do Conhecimento de modo a celebrar este dia?
É difícil descreve-las a todas pelo que convido todos a consultar o programa público embora, muito sumariamente, possa dizer que envolveram a observação e cultivo de microrganismos, a apresentação de bactérias marinhas, das que vivem em ambientes extremos, de fungos que fazem adoecer as árvores, de micróbios que limpam efluentes contaminados, que aumentam o valor nutritivo dos alimentos, que produzem antibióticos, que produzem materiais gelificantes e seu uso na cozinha molecular, ou que têm outras atividades industrialmente interessantes como a produção de cerveja e de pão, de biofertilizantes, etc.
Numa época do ano particularmente baixa no Pavilhão do Conhecimento (o início do ano letivo), esta atividade livre de um único dia atraiu ao Pavilhão cerca de mil pessoas de todas as idades que passaram, junto das várias atividades, um tempo muito agradável e instrutivo.
Pretende-se com a organização deste dia uma sensibilização da sociedade em geral para esta temática?
A existência do Dia do Microrganismo pressupõe que seria conveniente que a sociedade e a opinião pública em geral tivessem uma perceção mais apurada sobre a importância dos microrganismos para a compreensão dos mecanismos fundamentais da vida e sua evolução bem como para novos desenvolvimentos e aplicações na indústria biotecnológica, na reabilitação ambiental, na produção de energia, na agricultura e nos sectores de saúde, alimentação humana e animal.
Em que medida está o Técnico envolvido nesta iniciativa?
O Técnico, através do seu grupo de Ciências Biológicas do Instituto de Bioengenharia (iBB) e Biociências e do Departamento de Bioengenharia (DBE) esteve envolvido em 3 atividades. Estas atividades contaram com a participação do Núcleo de estudantes Engenharia Biológica e do clube de cervejeiros do Técnico e assentam na experiência ganha na organização dos laboratórios abertos do DBE.
A primeira atividade debruçou-se sobre a produção de cerveja artesanal e as leveduras que intervêm no seu fabrico, tendo sido apresentada no exterior do Pavilhão do Conhecimento. Os últimos anos foram marcados por um aumento significativo do número de pequenas empresas de cerveja artesanal em Portugal que competem no mercado com foco na qualidade e na diversidade das suas cervejas. De modo a apoiar o esforço da Cerveja D’Ourique o grupo tem isolado e identificado estirpes de várias espécies de levedura com o objetivo de produzir uma nova cerveja, com um sabor distintivo, com base numa mistura de leveduras isoladas em Portugal. A D´Ourique esteve presente com as suas cervejas para que o público as pudesse degustar.
As outras duas atividades decorreram dentro do Pavilhão. Uma delas pretendeu demonstrar como uma bactéria pode ser usada na produção de uma goma alimentar (com capacidade gelificante) e seu uso na cozinha molecular. A outra, visou explorar ferramentas de bio-informática na análise de sequências genómicas e de proteínas, por recurso a computadores
Falemos então agora, um pouco, sobre o ensino e a investigação da Microbiologia no Técnico.
No Técnico, toda a formação em Microbiologia realizada ao nível dos 3 ciclos de estudo é suportada por um corpo docente com reputação internacional, ativamente envolvido em atividades de investigação na área numa unidade de investigação excelente do sistema científico nacional, o iBB-Instituto de Bioengenharia e Biociências.
Por sua vez, a nível de investigação, o grupo de Ciências Biológicas do iBB desenvolve atividades nos campos da Microbiologia Molecular e Celular, da Genómica Funcional e Comparativa e Bioinformática e da Biotecnologia Microbiana. Os microrganismos estudados preferencialmente são as leveduras, as bactérias Gram-negativas e, mais recentemente, bactérias marinhas. Os vários programas e investigação e os projetos financiados são interdisciplinares que vão das moléculas aos sistemas, com o objetivo de compreender e de explorar ou controlar as suas atividades na Indústria, Saúde, Ambiente. A abordagem holística é uma marca dessa investigação de modo a compreender a complexidade dos sistemas microbiológicos e das respostas celulares aos desafios ambientais. A indispensável interdisciplinaridade da microbiologia moderna, assente nas interações sinérgicas entre as ciências biológicas, a informática, a matemática, a física, a química, e a engenharia, entre outras áreas do conhecimento, é também uma marca distintiva da investigação em microbiologia realizada no Técnico.
Uma sociedade mais informada nesta área será uma sociedade mais saudável?
A compreensão e controlo de uma forma global e racional do comportamento dos microrganismos são essenciais para a resolução de problemas biológicos complexos e dos desafios mais prementes da nossa sociedade, na área do ambiente, na produção e conservação de alimentos, na produção de energia, na saúde, na agricultura
Não posso deixar de salientar o papel dos microrganismos como fábricas celulares, essenciais para a resolução dos problemas mais prementes da nossa sociedade em direção a uma Bioeconomia, considerada prioritária para a Europa. Esta atividade económica assenta no uso de recursos renováveis para a produção dos produtos do nosso dia-a-dia (alimentos, compostos químicos, materiais, energia), através da Biotecnologia.