O Anfiteatro Abreu Faro esta quarta-feira, 12 de fevereiro, acolheu as dezenas de alunos, colegas e familiares que fizeram questão de marcar presença na cerimónia da jubilação do professor Luíz Braga Campos, docente catedrático do Instituto Superior Técnico, apontado como o grande impulsionador da área de Engenharia Aeroespacial na escola, e dono de uma carreira invejável. Tal como é usual nestas cerimónias, fez-se jus à “carreira do homenageado”, pela voz de outros e através das recordações do docente que na sua última lição fez questão de prosseguir o principal desígnio de um professor: partilhar. Desta vez a matéria cingiu-se às suas lições do “passado que podem ser muito úteis no futuro”. Ninguém levou caderno de apontamentos, mas certamente muitos tiraram notas e encontraram inspiração.
As palavras iniciais ficaram a cargo do presidente do Técnico, professor Rogério Colaço, que começou por realçar “a longa e profícua carreira do homenageado”. “O professor Braga Campos marcou uma enorme quantidade de gerações que passaram pelo Técnico, e está indelevelmente associado ao sucesso do nosso curso de Engenharia Aeroespacial”, afirmou o presidente do Técnico. Definindo esta cerimónia como o marco “de um novo começo na vida do professor” que continua “cheio de vida e de ideias que quer concretizar”, o professor Rogério Colaço elogiaria a “perseverança”, a “competência” e “capacidade de trabalho” do homenageado, agradecendo em nome do Técnico a forma como colocou todas estas características ao serviço da escola.
Coube ao professor Fernando Lau, atual colega do professor Luíz Braga Campos, a “árdua tarefa” -como próprio a denominou-, de apresentar de forma resumida uma carreira que “já totaliza meio século”. Abordando os cargos, os prémios e as patentes em que o homenageado se envolveu, o docente ia exaltando “a sua contribuição profícua nesta área”. “É inegável que a sua atividade científica nos últimos 50 anos é imensa e variada”, referia o professor Fernando Lau, recorrendo aos números para representar a afirmação. “O professor foi autor de 157 artigos científicos em 63 revistas diferentes nas suas principais áreas de investigação: matemática, física, mecânica e aeronáutica”, apontou a determinada altura. Depois de concluir esta hercúlea tarefa de traduzir em números uma carreira imensa, o docente do Departamento de Engenharia Mecânica(DEM) centrou-se naquele que na sua opinião constitui “o principal contributo do professor Braga Campos para esta casa”: o curso de Engenharia Aeroespacial. “Este mestrado é, claramente, um caso de sucesso, e para isso muito contribuiu a atividade do professor e as suas iniciativas”, disse. “O professor tem feito um trabalho intenso na internacionalização do curso”, acrescentou, frisando que é este imenso contributo e carreira “que hoje estamos aqui a comemorar”.
Naquela que seria a sua última aula, o professor Luiz Braga Campos percorreu o seu passado como aluno, os primeiros tempos no Técnico como docente, e o trajeto que foi trilhando no arranque e consolidação da área de Engenharia Aeroespacial na escola. Recorrendo à aprendizagem que esta bagagem lhe trouxe e que quis partilhar com a sua escola, o docente não se coibiu de sobrevoar aquele que adivinha como “um futuro auspicioso para a Engenharia Aeroespacial”.
Recordando as suas vivências como aluno- com algum humor pelo meio- o professor Luiz Braga Campos falou da única cadeira a que reprovou, dos professores que o inspiraram, das “sebentas arcaicas” e das discrepâncias que havia no ensino, “dependendo do professor e da disciplina”, numa “altura em que havia pouca preocupação com o insucesso escolar”. Depois do Técnico, seguiu-se o doutoramento em Cambridge que fez com uma bolsa que lhe estabelecia “o compromisso de regressar a Portugal e lecionar pelo menos 10 anos”. Ainda que “não havendo nenhuma sanção para quem não cumprisse o compromisso, e “embora as perspetivas não fossem otimistas”, o professor do Técnico decidiu regressar. Em terras lusitanas, deparou-se com um contraste total face a tudo o que deixara em Inglaterra, nomeadamente ao nível da investigação. “As condições de investigação resumiam-se a uma palavra: inexistentes”, confessou. “O regresso foi como cair num poço muito fundo com pouca luz”, acrescentava de seguida.
Quando começou a incentivar a criação do curso de Engenharia Aeroespacial, o professor Luiz Braga Campos foi apelidado do “maluquinho dos aviões”. “Considerei que havendo mais de 600 engenheiros em Portugal a desempenhar funções ligadas à aeronáutica devia existir um curso de engenharia nesta área”, referia, assumindo que a ideia não foi bem-recebida inicialmente no Técnico. O projeto acabou por avançar, muito graças a influências externas, e apesar de ter demorado algum tempo “foi criado um curso de raiz desde o primeiro ano tal como nas melhores universidades”. “Recorreu-se apenas a docentes do Técnico e a prata da casa, o curso teve resultados muito melhores do que os professores importados da UBI [Universidade da Beira Anterior]”, referia ainda o homenageado. Sublinhando o sucesso alcançado por este curso, “apesar dos recursos limitados”, o docente não se esqueceria de distribuir os devidos créditos em torno deste trabalho. “Este sucesso também só foi possível graças a um grupo de docentes que criaram mais de 20 disciplinas novas incluindo as 10 iniciais”, disse, apresentando uma listagem. “Fiz a lista de nomes porque sem estes docentes a Engenharia Aeroespacial não teria existido no Técnico; e também porque recebi a maior parte dos créditos deste trabalho e é meu dever tentar repor a factualidade do seu contributo essencial”.
A última parte da palestra do docente seria dedicada a explorar não só os fatores de atratividade da Engenharia Aeroespacial no Técnico “que devem ser mantidos e reforçados”, mas também as vulnerabilidades e as oportunidades. Vincando por diversas vezes que a existência de um sistema rígido de regras condiciona a liberdade de ensino, o docente avançaria depois para o futuro da Engenharia Aeroespacial, para a qual “não faltam perspetivas”. Por fim, e assumindo a sua dificuldade em resumir uma vida académica em apenas 50 minutos, o professor Luiz Braga Campos realçaria que esta jubilação tem dois significados: “que foram cumpridos os deveres profissionais perante a intuição” e que dará “lugar a outros para renovar a experiência e responsabilidades”. “A jubilação pode ser um fim de atividade, uma mudança de rumo ou uma continuação com menos apoios e mais liberdade”, vincou ainda.
A conclusão global da palestra do docente seria a lição retirada daquilo que apreendeu e simultaneamente fez: “Ao longo de gerações e décadas houve sempre docentes e funcionários que pela sua dedicação e trabalho fizeram a grandeza do Técnico. Tenho a certeza que continuará a ser assim com base nos colegas que conheço e que continuam ao serviço”.
Referindo que quase tudo já tinha sido dito sobre a carreira brilhante do professor Luiz Braga Campos, o professor Pedro Coelho, presidente do DEM, acabou por cingir a sua intervenção à leitura do diploma de reconhecimento pelo trabalho desenvolvido e que seria oferecido ao homenageado. O mesmo refletiria em palavras o agradecimento profundo e geral da escola para com tudo o que fez, “pelas gerações de estudantes depositárias do seu mérito científico, por todos os colegas favorecidos pela troca de conhecimentos, pelo DEM que enriqueceu com numerosos testemunhos de proficiência consubstanciados em ideias, projetos e publicações”.