Colaborar com a NASA e poder trabalhar com algumas das mentes mais brilhantes do mundo é um sonho para muitos, por vez difícil de atingir, mas não é impossível, e que o diga a aluna de doutoramento do Técnico e também investigadora do Centro de Recursos Naturais e Ambiente (CERENA), Helga Jordão, uma das 25 mentes brilhantes selecionadas para a edição deste ano do Frontier Development Lab (FDL). O grupo de jovens investigadores – selecionados de entre 257 candidatos- terão de dar resposta ao desafio de criar um modelo digital que permita prever a evolução do nível do mar e a dinâmica costeira, através de aprendizagem automática, mais rápido, e com menores necessidades computacionais do que os atuais.
O FDL é um programa interdisciplinar, organizado pela NASA em parceria com o SETI Institute e com apoio do Google Cloud, IBM, Intel, Microsoft e NVIDIA, que reúne as mais brilhantes da indústria e do meio académico em equipas interdisciplinares que exploram as inúmeras potencialidades da Inteligência Artificial aplicando-as a problemas críticos globais do nosso planeta.
A investigadora do CERENA é mesmo a única representante lusa na equipa constituída por investigadores das áreas das Ciências da Terra e do espaço e da Inteligência Artificial que integram o FDL. A oportunidade é única e exatamente por estar ciente disso, Helga Jordão não podia ter ficado mais radiante quando soube que havia sido selecionada, sentindo-se invadida por uma sensação de “felicidade total” e também alguma incredulidade. “No dia em que recebi o email a ser informada que tinha sido selecionada, devo ter relido umas 3 vezes seguidas para ter a certeza que estava a ler corretamente”, recorda Helga Jordão.
O programa, arrancou há 2 semanas e irá estender-se por mais 6. Até agora a aluna de doutoramento do Técnico afirma que tem sido “intenso e desafiante” e partilha um pouco da experiência de integrar este bootcamp intensivo, onde as valências de cada jovem investigador convergem para a solução. “Durante a primeira semana tivemos que definir as possíveis abordagens ao desafio, desde uma abordagem mais simples e logo mais segura até soluções mais complexas e por isso difíceis de executar. Ao mesmo tempo, tivemos formação em várias plataformas de Cloud”, revela a aluna de doutoramento.
As equipas estão diariamente em contacto, mas a experiência não tem fronteiras delimitadas, existindo também uma ligação com os elementos das restantes equipas e os parceiros. “Trocam-se ideias e conselhos e sentimos que estamos integrados numa enorme comunidade de especialistas em diversas áreas e em que todos estão interessados e focados nos diversos desafios”, conta a investigadora do CERENA. “Tem sido maravilhoso trabalhar com pessoas tão cheias de ideias e conhecimento”, frisa.
Em situações de emergência como as originadas por um evento de sobreelevação do nível do mar de origem meteorológica é crucial aceder atempadamente a mapas de previsão de modo a que sejam adotadas medidas minimizadoras dos impactos provocados por este tipo de fenómenos. Já existem modelos físicos capazes de o fazer que, tal como destaca a investigadora do CERENA, referindo que os mesmos “são considerados precisos e são definidos por um conjunto de equações diferenciais parciais”. No entanto, além do elevado tempo de processamento que lhes está associado, estes modelos necessitam de uma elevada capacidade computacional, o que os torna inacessíveis a determinados países, sem acesso a estas infraestruturas computacionais e fortemente fustigados por estes fenómenos naturais, como é o caso das Filipinas. “O nosso objetivo é através da aprendizagem automática criar um modelo digital que seja um substituto destes modelos já existentes, mas bastante mais rápido para possibilitar o seu uso como ferramenta operacional e com menores necessidades computacionais para que o seu uso não esteja restrito a certos países”, explica a aluna de doutoramento.
O contributo de Helga Jordão para a construção desta ferramenta está diretamente relacionado com a compreensão em termos físicos dos fenómenos meteorológicos e como estes interagem e afetam as zonas costeiras. Para este programa, a investigadora do CERENA traz a experiência adquirida ao longo do desenvolvimento da sua tese de doutoramento que se centra na modelação de corpos minerais complexos através da aplicação de redes neuronais profundas. A investigadora acaba também por ser dentro da equipa “um elo de ligação entre as ciências da Terra e a aprendizagem automática, uma vez que tenho valências nas duas áreas”, como a própria destaca.
Os jovens investigadores – de várias nacionalidades – irão ao longo destas semanas, e como apoio de mentores da NASA, Institute for Simulation Intelligence, MIT (+ MIT Portugal), Planet’s Analytics Applications, USGS e Berkeley Lab, tentar desenvolver esta inovadora e fulcral ferramenta. A este desafio junta-se o de desenvolver inteligência artificial sob a forma de uma rede neuronal. “Pretendemos utilizar Physics Informed Neural Networks, redes neuronais consistentes com as leis da física caracterizadas por equações diferenciais parciais não lineares”, explica a investigadora.
Todo o conhecimento desenvolvido durante este programa vai ser disponibilizado à comunidade sem custos, em código aberto, algo que como salienta Helga Jordão “faz parte da filosofia do programa FDL”. “No caso específico do nosso desafio um dos objetivos é mesmo criar um modelo digital computacionalmente mais leve para que o uso do modelo não esteja limitado a alguns países. E não faria sentido este objetivo se não fosse código aberto”, sublinha a investigadora.