O evento de lançamento da 4.ª edição do projeto “Engenheiras por um dia” deixava antever o dinamismo, o entusiasmo e a vontade de fazer a diferença que inundarão as inúmeras iniciativas em que este projeto se desdobra ao longo do ano. Tal como grande parte das iniciativas ao longo do ano, o evento decorreu em formato online, esta quinta-feira, 29 de outubro, e a transmissão somou centenas de visualizações.
A Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, uma das responsáveis pelo surgimento deste projeto, fez questão de participar no evento lembrando alguns números que tornam evidente o papel fulcral do “Engenheiras por um dia” na desconstrução de estereótipos e das conceções que determinam a segregação das profissões. Rosa Monteiro lembraria na sua intervenção a forma como o projeto surgiu e o crescimento exponencial do mesmo de edição para edição, agradecendo o envolvimento e empenho de todos os parceiros. “Quando começamos a pensar e desenhar este projeto não foi fácil que fosse aceite. Havia quem não acreditasse que a segregação sexual das escolhas educativas e das profissões é uma dimensão crucial das desigualdades que pendem sobre as mulheres em tudo o resto”, recordava. “Persistimos e insistimos e hoje estamos aqui para apresentar a 4.ª edição de um projeto revigorado e cada vez mais forte, e que é já uma marca no combate à segregação na educação e profissões”, declarava de seguida a governante.
Enunciando alguns dos dados presentes no Índice da Igualdade de Género de 2020 – uma iniciativa do European Institute for Gender Equality (EIGE)-, conhecidos esta quinta-feira, a secretária de Estado referia que estes dados dão “uma ideia de Portugal em duas velocidade e duas dimensões”. “Por um lado, indicam-nos, mais uma vez, que estamos a avançar mais rapidamente do que a média europeia na igualdade de género, com avanços sobretudo naquilo que diz respeito à presença de mulheres em cargos de decisão e estamos em 16.ª global no ranking global”, referia. “Por outro lado, temos um destaque negativo pela persistente segregação sexual quer na educação, quer nas profissões, representando as mulheres apenas 16% das pessoas especialistas e 19% das pessoas diplomadas nas Tecnologias da Informação e Comunicação”, transmitiu.
A reduzida presença das mulheres nas Engenharias, nomeadamente no campo das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) foi sendo fundamentada com outras percentagens resultantes de vários estudos. “Estas assimetrias que se verificam quer nas áreas de estudo e do ensino, mas depois também no mercado de trabalho, têm sido explicadas por um conjunto de fatores, sendo que na base destes estão obviamente as conceções estereotipadas das profissões, dos papéis de género daquilo que homens e mulheres estão mais aptos e de quais são as áreas profissionais que são mais adequadas a uns e a outras”, expunha Rosa Monteiro.
Para a Secretária de Estado estes “números tornam-se particularmente preocupantes quando analisamos o presente e o futuro das nossas sociedades num contexto de acelerada digitalização, pelo risco associado a sistemas de Inteligência Artificial baseados em algoritmos, muitos deles enviesados, mas também pelas novas formas de violência online, ou pelas novas formas de organização e prestação do trabalho e a consequente precarização das relações laborais”. Sublinhando que será nestas áreas que haverá “maior criação de emprego, sobretudo emprego altamente qualificado”, Rosa Monteiro acentuava que “não podemos deixar que as mulheres fiquem de fora desta economia digital, de fora do presente e do futuro”.
Para a desconstrução de estereótipos e na luta pela melhoria destes rácios de participação de mulheres e raparigas nestas áreas existem, além do projeto “Engenheiras por um dia”, outras iniciativas governamentais mencionadas por Rosa Monteiro. “O combate à segregação sexual das profissões e escolhas educativas é um desígnio que temos de manter com muito empenho porque ele é, na minha opinião, estruturante no conjunto de outras desigualdades designadamente a discriminação salarial que temos de vencer”, vincou. Por fim, a Secretária de Estado partilhava o seu desejo de que esta nova edição “nos possa levar a novas descobertas, novas aprendizagens e a mais resultados neste caminho que é sempre de promoção de um país mais igual”.
Ficaria a cargo de Margarida Mateus, coordenadora de projetos Associação Portuguesa para a Diversidade e Inclusão (APPDI), a apresentação dos moldes em que irá decorrer esta 4.ª edição, que terá como grande suporte o formato digital. Além da criação do site do projeto, Margarida Mateus apresentou as novas iniciativas e os números que demonstram o sucesso desta edição, e frisou várias vezes “o orgulho de vermos que o número de parcerias deste projeto tem vindo a crescer”.
“Porque é as engenharias e as TIC continuam a ser um bicho-papão?”
A exclusão digital das mulheres, as inúmeras oportunidades nestas áreas, a necessidade de combater as desigualdades salariais, e as ações a tomar para tentar combater este afastamento das raparigas e mulheres destas áreas, foram alguns dos tópicos abordados pelas convidadas do painel que se seguiu.
“Porque é as engenharias e as TIC continuam a ser um bicho-papão?”, foi a pergunta que daria o “pontapé de saída” do debate que se seguiria que juntou Luísa Lopes- Ceo do .PT e também coordenadora do eixo 1 da iniciativa “incode.2030”, Lídia Santiago, vice-presidente nacional da Ordem dos Engenheiros, e a professora Isabel Ribeiro, vice-presidente do Instituto Superior Técnico para a modernização administrativa. A pergunta seria lançada pela jornalista Catarina Carvalho que moderou o debate.
A exclusão digital das mulheres, as inúmeras oportunidades nestas áreas, a necessidade de combater as desigualdades salariais, e as ações a tomar para tentar combater este afastamento das raparigas e mulheres destas áreas, foram alguns dos tópicos que foram sendo abordados pelas convidadas.
“Existem estudos que dizem que se houvesse igualdade de género em 2030 aumentaríamos cerca de 6,1% o PIB da União Europeia, porque tínhamos mais profissionais nesta área. Isto é uma questão não só de igualdade de género, mas também é uma questão económica”, referia a determinada altura Luísa Ribeiro Lopes.
Dando o seu exemplo e a forma como através da robótica consegue inspirar e impulsionar a curiosidade pela engenharia, a professora Isabel Ribeiro afirmava que é “necessário atuar ao nível da educação, mas ao nível do ensino básico porque é aí que vamos desmistificar o mundo da engenharia. Se começarmos desde cedo, vamos conseguir que vocações que possam estar escondidas venham ao de cima e que os rapazes, e sobretudo as raparigas percebam que podem montar um kit de robô, programar, pôr o robô a andar, etc.”, declarava a vice-presidente do Técnico. Às famílias que muitas vezes questionam a opção das engenharias, a professora Isabel Ribeiro deixava uma mensagem: “Engenharia sim, porque estes alunos quando se formam têm emprego garantido, e a tendência é que cada vez sejam mais procurados pelas empresas”, salientou.
A vice-presidente nacional da ordem dos engenheiros evidenciaria “que hoje em dia ainda não é fácil chegar a postos de comando e à desigualdade salarial”. “As engenharias são cursos muito trabalhosos e para ganhar o mesmo que em outras áreas, muitas vezes estas jovens optam por tirar cursos mais simples e acessíveis de se fazerem”, dizia a Lídia Santiago, diagnosticando uma falta de paixão pela engenharia nos jovens hoje em dia. A professora Isabel Ribeiro apresentaria remédio para este problema: “A paixão e ambição também se pode ensinar e estimular. Muitas vezes não há conhecimento destas áreas e quem não sabe não pode ter paixão, e temos que ser capazes de a mostrar”.
A presidente da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), Sandra Ribeiro, encerraria a cerimónia contando uma história que demonstraria a cultura sexista que existe em torno da tecnologia. “Estamos, agora, a viver o futuro do trabalho e a digitalização é a chave dos tempos em que vivemos, e dos que se seguem, e as raparigas não podem perder este comboio”, vincou. Realçando também o sucesso deste projeto, a presidente da CIG realçava a importância do envolvimento de empresas, escolas, pais, educadores, profissionais nesta luta, “porque só assim podemos ter sucesso”, concluía.
O Projeto Engenheiras Por Um Dia é uma iniciativa da Secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade, e é coordenado pela CIG em articulação com a Carta da Diversidade (APPDI), pelo Instituto Superior Técnico e Ordem dos Engenheiros. Envolvendo 53 entidades parceiras – empresas e municípios, 22 escolas e 12 institutos de ensino superior o projeto promove junto das jovens a opção pelas engenharias e pelas tecnologias, desconstruindo a ideia de que estas são domínios masculinos. As anteriores edições do projeto já envolveram 7975 jovens do 3.º ciclo e ensino secundário, em mais de 350 atividades.
Além das habituais iniciativas do projeto, esta edição que aposta na componente digital, mantendo as atividades e adaptando-as ao contexto atual de combate à pandemia COVID-19, conta com um projeto-piloto de mentoria e um ciclo de workshops virtuais acerca das várias áreas da engenharia.