Markus Niederberger, investigador da ETH Zürich (Suiça), trouxe, a 18 de junho, à Torre Sul do campus Alameda do Instituto Superior Técnico, uma lista de projetos que tem desenvolvido na área da química de materiais, em particular trabalhos com nanopartículas e aerogéis, que podem desempenhar papéis importantes na seleção de materiais com impacto em sectores como a proteção da corrosão de materiais e o aumento da eficiência energética. A IST Distinguished Lecture intitulada “Wet Chemical Synthesis and Processing of Nanoparticles” – “tenho de admitir que o título é um bocadinho chato, mas vou mostrar tudo o que fazemos”, brincou e prometeu o investigador – foi coorganizada pelo Centro de Recursos Naturais e Ambiente (CERENA) e pelo Departamento de Engenharia Química (DEQ) do Instituto Superior Técnico. Markus Niederberger, criador do Laboratório de Materiais Multifuncionais da ETH, cumpriu a promessa e falou inclusivamente de áreas que desenvolveu quase por acidente. É importante “ter sempre os olhos abertos”, ver “alguma coisa diferente no laboratório” pode dar origem a novas linhas de investigação, defendeu. Outros desenvolvimentos científicos apenas foram possíveis graças à colaboração com outras instituições. “Isto é o que devem fazer, se não souberem uma coisa, devem procurar especialistas e trabalhar em conjunto”, aconselhou.
Em entrevista, Markus Niederberger mostra-se “muito impressionado” com a investigação que se faz no Técnico e fala sobre o seu percurso e sobre o que considera mais importante para o futuro da investigação nesta área.
Como é que se tornou um investigador? Era um sonho ou aconteceu?
Markus Niederberger – A razão para me ter tornado num cientista foi por ter tido, na escola secundária, um professor de química extremamente inspirador e motivador. É uma coisa que, provavelmente, acontece muito raramente, ter um bom professor numa área específica. Eu fiquei verdadeiramente interessado em química e decidi estudar química. Apesar de ser um cientista de materiais, eu sou um químico.
E como é que escolheu esta área de investigação?
MN – Honestamente, às vezes é um bocadinho por coincidência. Eu comecei o meu doutoramento na área da síntese de nanopartículas. O meu orientador da altura propôs-me vários tópicos e eu escolhi um sem fazer ideia de que o tema iria seguir-me durante os 30 anos que se seguiriam. Então, fiz o meu doutoramento. Tenho de admitir que queria estudar e trabalhar noutro país, pelo menos uma vez na minha vida. Foi a principal razão para eu fazer um pós-doutoramento. E comecei a trabalhar em alguns assuntos que mostrei aqui, inspirado por um grupo francês. Eu tinha de resolver um problema muito específico e estes artigos do grupo francês ajudaram-me e eu continuei noutra direção, que correu muito bem, mas eu não esperava vir a trabalhar nesse tema durante tantos anos.
Fiz o projeto da síntese de titânio – que mostrei na apresentação – no pós-doutoramento há 30 anos. Tenho de admitir que, às vezes, na minha vida, não é tudo extremamente bem planeado, às vezes são oportunidades que aparecem e que eu decido experimentar.
Consegue selecionar o momento mais importante da sua carreira?
MN – Essa é uma pergunta interessante… Quando eu era líder de um grupo de investigação [no Max Planck Institute of Colloids and Interfaces] concorri para para uma posição de professor assistente na ETH Zürich e recebi uma carta da Universidade. Eu estava no meu gabinete e lembro-me de receber a carta que dizia ‘O presidente da ETH decidiu dar início às negociações consigo’. Eu não fazia ideia do que é que significava. Perguntei ao meu chefe : ‘eu recebi esta carta…’. E ele: ‘é uma oferta… é uma oferta para professor assistente. Parabéns!’. E esse foi o momento em que pensei ‘uau! Agora tornei-me professor’… foi uma grande experiência.
Quais são os grandes desafios desta área de investigação e o que pode a sociedade esperar dela?
MN – Não tenho a certeza se isto responde à pergunta, mas, ao longo dos anos, sinto que o grande desafio é trazer os meus resultados para uma aplicação prática. Quanto mais velho fico, mais importante isso é para mim. Eu gostava mesmo de ver algo no mundo real e isso é incrivelmente desafiante… do laboratório para uma aplicação. Não digo que todos têm de fazer isso, algumas pessoas fazem investigação fantástica durante toda a vida e está tudo bem. Mas para mim, isso tornou-se uma questão muito importante.
Falou, durante a sua apresentação, em startups. Desempenham um papel importante nessa transição?
MN – Para mim sim, as startups são o melhor porque, na Suíça, as empresas estão um pouco hesitantes em investigar em alguma coisa nova. Mas as spinoffs são feitas por pessoas que estão dispostas a correr riscos para investir alguns anos das suas vidas para tentar aplicar uma ideia e procurar possibilidades para que isso aconteça. Na ETH Zürich há possibilidades de financiamento para fazer exatamente isso. Chama-se Pioneer Fellowship e permite que se receba o salário de 18 meses para trazer os resultados de investigação para a ‘vida real’. Depois desses um ou dois anos, empresas têm de apoiar ou compram a ideia ou começam a colaborar. Mas o primeiro passo, a partir do laboratório, é muito complicado. Por isso penso que a solução de spinoff é excelente, se tivermos o estudante certo, que tenha verdadeiramente essas competências de contactar muita gente, estabelecer imensas redes de contacto. É preciso muita paixão para fazer isso e é duro.
Que opinião tem sobre a investigação que se faz no Instituto Superior Técnico?
MN – Estou muito impressionado com a investigação que se faz aqui. Trabalho com a Ana Marques e acho-a extremamente inspiradora, dedicada e motivada. Aqui há laboratórios fantásticos, muito bem equipados. Eu cooriento um estudante de doutoramento, que esteve já duas vezes em Zurique, no meu laboratório. É uma colaboração muito frutífera de partilha de estudantes, de que gosto imenso: [O Solar2Clean] é um projeto de desenvolvimento de microcápsulas [(inferiores a 1 mm)] muito porosas, para usar para a remoção de poluentes orgânicos persistentes da água [como antibióticos ou microplásticos] com a ajuda da luz solar. Tentamos preencher os poros das microcápsulas com as nossas nanopartículas, na expetativa que trabalhando juntos o projeto fique ainda melhor.
Que conselho gostava de dar aos jovens e futuros estudantes / investigadores?
MN – Uma das coisas mais importantes é estarmos abertos. Tanto em termos do que encontramos no laboratório, mas também para as possibilidades que a vida nos oferece em termos de possibilidades de trabalho. Quando recebemos uma oferta de uma empresa ou de uma universidade e ficamos a pensar “ah, eu não sei, talvez seja muito complicado…”. Não. Façam-no. Enquanto são jovens, façam-no, corram alguns riscos e divirtam-se. E isso é o mais importante. Temos de gostar do que fazemos. Em ciência é fundamental a nossa dedicação. Os salários não são os mais altos, pelo que é fundamental gostarmos do que fazemos.