Moungi Bawendi, Louis Brus e Alexei Ekimov são os vencedores do prémio Nobel da Química, tal como anunciado a 4 de outubro pela Academia Real das Ciências da Suécia. A edição deste ano laureou a investigação desenvolvida no âmbito dos pontos quânticos – partículas muito pequenas cujas propriedades, como a cor, podem ser alteradas em função do seu tamanho.
Docentes e investigadores do Técnico comentaram a atribuição deste prémio através dos órgãos de comunicação social, como é o caso de um artigo de opinião no jornal Público de Ermelinda Maçôas e um artigo do jornal Expresso com declarações de José Paulo Farinha. Este último partilha algumas impressões sobre a área de estudo galardoada com os leitores do site do Técnico:
Em que consistem os pontos quânticos e porque mereceram a atribuição deste prémio?
José Paulo Farinha (JPF): Os pontos quânticos são partículas cristalinas de materiais semicondutores, com dimensões de apenas alguns nanómetros (sendo que um metro tem mil milhões de nanómetros). As suas propriedades, como por exemplo a cor, podem ser ajustadas alterando apenas o seu tamanho.
As propriedades óticas, elétricas e magnéticas de um material são normalmente determinadas pela sua composição química. No entanto, à escala nanométrica – como é o caso dos pontos quânticos – as propriedades dependem fortemente do tamanho do material. No caso das partículas de materiais semicondutores, e para a mesma composição, a cor da luz que emitem varia com o seu tamanho. Ao diminuir o tamanho dos pontos quânticos, estes absorvem e emitem luz em zonas cada vez mais energéticas do espectro visível (a cor varia do vermelho para o azul).
Esta capacidade de sintonizar as propriedades óticas por alteração do tamanho dos pontos quânticos, sem necessidade de alterar a composição, está na origem das suas atuais aplicações tecnológicas e de outras que vão aparecer num futuro próximo.
Há investigação sobre pontos quânticos no Técnico?
JPF: No Técnico, vários investigadores usam pontos quânticos no seu trabalho, na área da bio-imagem e outras. Saliento o trabalho desenvolvido na área dos pontos quânticos de grafeno no grupo de Optical and Multifuncional Materials do Centro de Química Estrutural (CQE).
Que aplicações tecnológicas têm atualmente? E que outras prevê que possam vir a ter no futuro?
JPF: Os pontos quânticos são já amplamente utilizados em iluminação LED, em ecrãs de computador e televisão com tecnologia QLED, e em investigação biomédica, como marcadores celulares e de tecidos de elevado brilho e estabilidade. Prevê-se que possam vir a ser usados em criptografia quântica e células solares, onde, devido à quantização dos níveis energéticos, podem gerar múltiplas cargas por absorção de cada fotão, aumentando a energia elétrica produzida, e podendo mesmo vir a superar o limite teórico de eficiência dos dispositivos atuais.
Qual a contribuição que os laureados deram à investigação nesta área?
JPF: Ekimov descobriu os pontos quânticos, fazendo a ligação entre o seu tamanho e as propriedades ópticas. Brust, trabalhando independentemente, provou mais tarde que as suas propriedades se deviam a efeitos quânticos. Por seu lado, Bawendi desenvolveu o processo de produção dos pontos quânticos usando moléculas que controlam o seu tamanho e estabilizam as nanopartículas, o que permitiu obter pontos quânticos de dimensões precisas e elevada qualidade, possibilitando a aplicação desta tecnologia em larga escala.
Que outros avanços na área da Química gostaria de ter visto serem laureados com o Nobel deste ano?
JPF: As hipóteses são variadíssimas! Pensando apenas na área da nanotecnologia, são de referir os nanoclusters metálicos, partículas com poucos átomos metálicos (dimensões abaixo de 2 nanómetros). Por exemplo os nanoclusters de ouro são fotoestáveis e biocompatíveis, emitindo luz de cor definida pelas suas dimensões (como os pontos quânticos), podendo substituir os corantes naturais e sintéticos em bio-imagem e outras aplicações. Possuem também propriedades magnéticas e atividade catalítica muito promissora para aplicação em biocatálise, fotocatálise e eletrocatálise.
Uma outra hipótese é a polimerização radicalar controlada, uma tecnologia que revolucionou a produção de polímeros com tamanho, composição e arquitetura extremamente bem definidos, e que são frequentemente usados na produção por auto-montagem de diversos materiais nanoestruturados.
Por último, acrescento os MOFs (metal-organic frameworks), materiais híbridos nanoestruturados de elevada porosidade e versatilidade de composições, com aplicação muito promissora em áreas tão importantes como a catálise, a captura de dióxido de carbono, o armazenamento de combustíveis (hidrogénio e metano, por exemplo), a remediação ambiental e a entrega controlada de fármacos, entre muitas outras.