Ciência e Tecnologia

Os lasers de alta potência e o seu alcance desconstruídos pelo Prémio Nobel da Física

Perante uma vasta audiência, Gérard Mourou explicou a importância da tecnologia, explorando as muitas aplicações e o seu impacto na vida humana.

Não é todos os dias que temos a oportunidade de assistir à palestra de um Prémio Nobel. A lotação esgotada e o aproveitamento de qualquer espaço vazio para poder assistir à palestra que o professor Gérard Mourou deu esta quarta-feira, 24 de abril, no Técnico demonstravam exatamente essa consciência, mas acima de tudo revelavam a extrema vontade de aprender com o físico e de descobrir mais sobre a invenção que lhe valeu o mais prestigiado galardão da Física em 2018.

Coube à professora Marta Fajardo, docente do Departamento de Física (DF) introduzir o orador- ainda que sabendo que seriam poucos os que desconheciam a dimensão e projeção da sua investigação. Demonstrando a importância do “trabalho pioneiro” desenvolvido pelo Físico para todos os que trabalham na área, “revolucionando completamente a tecnologia laser”, a docente do Técnico agradecia ao físico a sua disponibilidade “para vir até nós, partilhar o seu conhecimento, e inspirar uma nova geração de cientistas com a sua brilhante carreira”.

Ao abrir a sessão o professor Gérard Mourou não esqueceu a sua orientanda, Donna Strickland – também premiada com o Nobel da Física em 2018 –, com quem aperfeiçoou a técnica CPA (chirped pulse amplification), descerrando caminho para a criação dos pulsos de laser mais curtos e intensos. “Foi uma honra receber o Prémio Nobel da Física, mas também foi uma honra recebe-lo com ela”, declarava, debruçando-se depois sobre a apresentação que preparara e que pretendia demonstrar os benefícios para a vida humana da luz intensa, intitulada “Paixão Extrema, Luz Extrema”.

Começando por expor como é que os lasers de alta intensidade são gerados, o físico explicava que “para produzir lasers de alta potência, a luz é esticada, amplificada e depois comprimida”.  Ao lembrar que tudo começou em 1960 quando o físico norte-americano Ted Maiman conseguiu pela primeira vez emitir “luz coerente”, o orador declarava que, 60 anos depois, “os lasers são um milhão de vezes mais poderosos”. “Recorrendo aos mesmos podemos criar uma pressão tão forte equivalente a equilibrar dez milhões de torres Eiffel na ponta de um dedo”, assinalava o orador.

O professor aprofundaria depois os diferentes tipos de lasers e o seu espectro de intensidade, enunciando algumas das aplicações dadas aos mesmos, como por exemplo para criar pequenos detalhes na superfície dos materiais, “sendo capaz de cortar material sem o danificar uma vez que o processo se realizar num período muito curto”. Foi, porém, na abordagem da aplicação desta técnica à oftalmologia que o orador mais se demorou, explanando a forma como os pulsos de laser podem cortar a córnea sem ferir o tecido. “Os lasers de femtosegundos revolucionaram a oftalmologia”, afirmou a determinada altura.

Ainda no campo da medicina, mas desta vez na área nuclear, o físico explicava como esta tecnologia se pode revelar cada vez mais essencial quer a nível terapêutico, quer ao nível de diagnóstico. “Os lasers de alta potência são mais compactos, mais precisos e menos caros que os equipamentos tradicionais”, apontava orador.  Outra das aplicações da tecnologia, e com a qual Gerard Mourou se revelou extremamente entusiasmado, passa pelo combate ao lixo radioativo que resulta da produção de energia nuclear. “Devido às missões espaciais, atualmente há o equivalente a quatro torres Eiffel de resíduos em órbita, o que limita o acesso ao espaço”, assinalava, explicando como se pode recorrer aos lasers amplificados para atingir os pedaços mais pequenos: “focamos um laser nos resíduos e criamos uma nuvem de matéria. “Essa nuvem de matéria vai produzir um efeito de foguete e nós desorbitamos os destroços, e os resíduos vão para a atmosfera e queimam”, prosseguia.

Em jeito de conclusão, o professor Gérard Mourou resumiu a importância da luz extrema “capaz de gerar o maior campo, maior aceleração, maior temperatura e maior pressão”, e por isso mesmo transporta novas “esperanças e oportunidades para o futuro da ciência e da sociedade”. E porque a audiência denunciava a curiosidade, o orador reservou alguns minutos para partilhar imagens e recordações do momento em que recebeu o galardão. Do “momento emocionante” recorda com especial carinho ter podido estar perante o livro onde constam as assinaturas de todos os vencedores do Prémio Nobel da Física. Em jeito de brincadeira terminava dizendo: “de todos os Prémios Nobel o mais importante é sem dúvida o da Física”.