Três dos projetos selecionados pela Assembleia Geral do EUROfusion, no âmbito do programa “Enabling Research”, contam com o conhecimento e a experiência do Instituto de Plasmas e Fusão Nuclear (IPFN). Os projetos “Advances in real-time reflectometry plasma tracking for next generation machines: Application to DEMO”, coordenado pelo investigador Filipe da Silva, e “Energetic particle optimization of stellarator devices using near-axis magnetic fields”, coordenado pelo investigador Rogério Jorge, estão entre os 16 projetos vencedores, escolhidos por entre as 72 propostas apresentadas a concurso. O IPFN participa ainda em outro projeto vencedor, o “Advancing shock ignition for direct-drive inertial fusion”, coordenado pela Université de Bordeaux (França).Estas bolsas permitirão aos beneficiários desenvolver novas ideias e técnicas inovadoras relacionadas com a fusão nuclear.
Liderado por Filipe da Silva, o “Advances in real-time reflectometry plasma tracking for next generation machines: Application to DEMO” junta os principais peritos e investigadores de reflectometria na Europa, cobrindo as áreas de micro-ondas, reflectometria sintética, diagnósticos de reflectometria, processamento de sinal e códigos de simulação. A reflectometria terá um papel de destaque nas próximas máquinas de fusão nuclear, nomeadamente no DEMO, tendo como função principal o posicionamento e monitorização do plasma, substituindo os diagnósticos magnéticos.
“Os primeiros passos para esse objetivo já foram dados experimentalmente, teoricamente e por simulações. No entanto, um trabalho de base considerável ainda se encontra por fazer e este projeto almeja responder a muitas das questões que permanecem em aberto e conseguir uma abordagem coerente e unificada que permita a implementação de um sistema de reflectometria capaz de fornecer os dados de entrada para controlo das descargas, não só no regime estacionário, mas também durante a fase inicial, transitória”, explica Filipe da Silva.
O investigador do IPFN partilha que a equipa se encontra “extremamente agradada com a atribuição do projeto”. “Acima de tudo porque o mesmo permitirá coligir esforços para um objetivo importante, o qual de outra forma avançaria muito mais devagar e de forma fracionada”, afirma.
A equipa conta com mais quatro investigadores do IPFN – Jorge Santos, António Silva, Jorge Ferreira e Emanuel Ricardo- e reúne também cientistas do Commissariat à l’énergie atomique (CEA), Université de Lorraine, United Kingdom Atomic Energy Authority (UKAEA), Agenzia nazionale per le nuove tecnologie (ENEA) e do Consorzio RFX.
Os papéis desempenhados pelos cientistas do IPFN neste projeto são variados.“Para além de coordenar o projeto, terei interversão na implementação e simulação de diagnósticos de reflectometria, com a colaboração direta de Emanuel Ricardo”, evidencia Filipe Silva. “Jorge Ferreira tem a seu cargo a física e modelização, Jorge Santos trabalhará em análise de dados e António Silva é perito em eletrónica de micro-ondas. Saliente-se que todos estes domínios não só não são estanques, como necessitam de uma forte interação, não só entre os colegas do Técnico, mas também entre todos os participantes no projeto”, complementa ainda, o coordenador do projeto.
O projeto “Energetic particle optimization of stellarator devices using near-axis magnetic fields” enquadra-se no tema da fusão nuclear controlada. “Com a fusão, pretendemos obter energia renovável e limpa que possa complementar outras fontes de energia como a solar e a eólica. Este projeto vai permitir dar um passo muito importante nesta direção ao explorar uma técnica inovadora para calcular campos magnéticos em reatores de fusão na presença de um plasma”, evidencia o investigador Rogério Jorge.
Tal como explica o investigador do IPFN, “esta técnica consiste em primeiro determinar o campo magnético no centro (ou eixo) do plasma e, assim, conseguir extrapolar o resultado para uma região mais abrangente para fora do plasma”. “Esta é uma maneira de calcular campos radicalmente diferente daquela que é utilizada hoje em dia em que primeiro se determina o campo numa superfície conseguindo de seguida calcular o campo no interior desta superfície”, adiciona.
Este projeto tem duas vertentes, sendo a primeira a otimização da posição do eixo do plasma (a chamada near-axis expansion). “Aqui, são utilizadas técnicas matemáticas de otimização utilizando ferramentas computacionais que estão a ser desenvolvidas em várias universidades americanas, como a Universidade de Princeton, a Universidade de Maryland e a Universidade de Nova Iorque”, realça o coordenador do projeto. A segunda vertente é o cálculo da trajetória das partículas energéticas que constituem o plasma. “Neste sentido, vários elementos do IPFN que agora integram o grupo responsável pelo projeto têm estado a desenvolver programas computador que permitem calcular a trajetória de milhões de partículas em simultâneo utilizando supercomputadores modernos com o objetivo de determinar quanto tempo ficam estas confinadas dentro da máquina”, explica Rogério Jorge. “Combinando as duas técnicas, vamos procurar um design otimizado para um reator de modo a conseguir confinar as partículas o máximo de tempo possível e, assim, gerar energia”, acrescenta Rogério Jorge.
Apesar de cada uma das vertentes deste projeto já ter sido desenvolvida individualmente por vários grupos de investigação um pouco por todo o mundo, esta é a primeira vez que estas são reunidas num único projeto. Esta bolsa permite também a união de um dos poucos grupos a nível mundial que desenvolve linhas temáticas de teoria e modelização em stellarators (máquinas de fusão com um formato torcido, três-dimensionais) e partículas energéticas simultaneamente. “Acreditamos que, com estas valências, poderemos ser pioneiros no desenho e construção da próxima geração de reatores de fusão nuclear controlada”, vinca o coordenador do projeto, que terá a duração de 2 anos e conta com 93,5 mil euros de financiamento.
O investigador Rogério Jorge revela que “toda a equipa se sente, naturalmente, muito orgulhosa”, com esta conquista. “O processo de seleção para estas bolsas, as Enabling Research, é muito competitivo, tendo o nosso projeto concorrido com equipas de cientistas presentes um pouco por toda a Europa”, sublinha. “Dado que é a primeira vez que Portugal é galardoado com tal distinção, e ainda por cima com 2 bolsas este ano, todo o instituto está muito feliz. A nível pessoal, estou infinitamente feliz por regressar ao Técnico num futuro próximo após vários anos de doutoramento e pós-doutoramento no estrangeiro”, confessa ainda o investigador.
Finalmente, o IPFN participa também no projeto “Advancing shock ignition for direct-drive inertial fusion” liderado pela Université de Bordeaux (França) e que conta com a professora Marta Fajardo, docente do Departamento de Física (DF), como líder da equipa local. O projeto estuda a possibilidade de realizar uma fonte de energia limpa e renovável, por fusão a laser. “As tentativas para realizar a chamada Fusão por Confinamento Inercial falharam até agora, por ser muito difícil criar uma explosão numa esfera de combustível e comprimi-la ao mesmo tempo. O plasma criado desenvolve todo o tipo de instabilidades para contrariar essa compressão. Até agora os lasers não eram suficientemente controláveis para disparar diretamente no alvo, pelo que havia uma compressão indireta – os lasers eram usados para transformar a sua energia em raios-X num pequeno forno, no centro do qual se colocava a esfera de combustível”, salienta a docente do Técnico.
Com os avanços na tecnologia laser, e tal como explica a professora Marta Fajardo, “torna-se possível controlar muito melhor a irradiação direta da esfera, e inclusivamente lançar sucessivas vagas de energia laser para enviar ondas de choque que equilibram exatamente as forças de expansão e implosão da esfera de combustível”. Neste projeto irá ser estudada a interação laser-plasma, em várias experiências nos maiores lasers do mundo, para testar esta ideia.
No projeto estão envolvidas 28 instituições europeias e quatro laboratórios parceiros nos EUA e Japão, e ao IPFN caberá trabalhar nos novos diagnósticos capazes de fazer imagens dos plasmas ultra-densos criados por estes choques, para obter radiografias da implosão.