Ciência e Tecnologia

A dança de uma estrela em torno de um buraco negro prova que Einstein tinha razão

O professor Vítor Cardoso é um dos investigadores envolvidos nas observações levadas a cabo pelo Very Large Telescope (VLT) e que comprovam a Teoria da Relatividade Geral de Einstein.

Durante décadas, um grupo de investigadores- entre os quais um docente do Técnico- teve os olhos postos na galáxia, e acabou por descobrir uma estrela conhecida como S2 a dançar à volta de um buraco negro supermassivo, exatamente ao som do que estava previsto na Teoria Geral da Relatividade de Albert Einstein. Na primeira fila deste espetáculo protagonizado pela S2 estava o professor Vítor Cardoso, docente do Departamento de Física (DF) e investigador do Centro de Astrofísica e Gravitação (CENTRA). Também o professor António Amorim, docente da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, e o professor Paulo Garcia docente da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), e também investigadores do CENTRA estiveram envolvidos  no projeto GRAVITY.

As observações feitas com o Very Large Telescope (VLT) do ESO – a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em Astronomia-  revelaram pela primeira vez que uma estrela que orbita o buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea se move tal como previsto pela Teoria Geral da Relatividade de Einstein. A sua órbita tem a forma de uma roseta e não de uma elipse, como previa a Teoria da Gravidade de Newton. Este resultado há muito procurado foi possível graças a medições muito precisas ao longo de quase 30 anos, que permitiram aos cientistas desvendar os mistérios do “monstro” que se esconde no coração da nossa galáxia.

A equipa científica internacional, composta por cientistas portugueses, franceses e alemães, constatou através do VLT do Observatório Europeu do Sul no Deserto do Atacama, no Chile, e os resultados da investigação foram publicados na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics esta quinta-feira, 16 de abril.  “Esta descoberta observacional fortalece a evidência que aponta para Sagitário A* ser um buraco negro supermassivo com 4 milhões de massas solares”, sublinha Reinhard Genzel, diretor do Instituto Max Planck de Física Extraterrestre (MPE) em Garching, Alemanha, e o cientista por detrás do programa de 30 anos que permitiu chegar a este resultado.

Localizado a 26 000 anos-luz do Sol, Sagitário A* e o denso aglomerado de estrelas que o rodeia assumem-se como um laboratório único para testar a física num regime de gravidade extrema e inexplorado. Uma destas estrelas, a S2, desloca-se em direção ao buraco negro atingindo uma proximidade de 20 mil milhões de km (o que corresponde a cento e vinte vezes a distância entre o Sol e a Terra), sendo assim uma das estrelas mais próximas encontradas em órbita do gigante massivo. Na sua máxima aproximação ao buraco negro, a S2 desloca-se pelo espaço a uma velocidade de quase 3% da velocidade da luz , completando uma órbita a cada 16 anos.

A órbita de S2 revelava desde logo a sua particularidade, uma vez que normalmente as  estrelas e os planetas têm uma órbita não circular e, por isso,  o seu deslocamento afasta-as e aproxima-as do objeto que orbitam. “A órbita da S2 precessa, o que significa que a localização do ponto mais próximo do buraco negro supermassivo muda a cada órbita, de tal modo que a órbita seguinte se encontra rodada relativamente à anterior, fazendo assim com que o seu percurso siga a forma de uma roseta”, pode ler-se no comunicado. Ora se a Relatividade Geral nos dá  uma previsão precisa de quanto é que a órbita muda, as medições mais recentes vão exatamente ao encontro da teoria. “Este efeito, chamado precessão de Schwarzchild, nunca tinha sido medido anteriormente numa estrela em órbita de um buraco negro supermassivo”, explicam ainda os investigadores em comunicado.

A equipa portuguesa participou nas mais de 330 medições da posição da estrela, que completa uma órbita na proximidade de Sagitário A* ao fim de 16 anos, mas também no “desenho e construção” de um componente de um instrumento do telescópio VLT que permite “obter imagens do ambiente próximo do buraco negro”, como evidenciou o professor António Amorim no comunicado enviado pelo CENTRA.

Esta descoberta é conhecida a poucos dias de se comemorarem os 65 anos da morte de Albert Einstein, a 18 de abril, e é portanto,  uma boa forma de homenagear a genialidade do físico alemão. Para o professor Vítor Cardoso, “este resultado mostra que a teoria da relatividade geral se mantém válida na proximidade de um buraco negro com milhões de massas solares”. O GRAVITY permitirá estudar a gravidade ainda mais perto do horizonte do buraco negro. “Iremos investigar se haverá mais física, além da relatividade geral de Einstein, nessa última fronteira”, conclui o docente do Técnico.