“Uma mulher que não se conformou com o seu destino”, descreveu Rogério Colaço, presidente do Instituto Superior Técnico, ao recordar a figura de Maria de Lourdes Pintasilgo na cerimónia de 3 de dezembro de 2025, que assinalou a 9.º edição do Prémio que a homenageia.
Criado para distinguir anualmente alumnae do Técnico pelo percurso académico, profissional ou impacto social, o Prémio reforça, nas palavras do presidente do Técnico, a intenção de “promover as mulheres na engenharia”, num contexto em que persistem “falta de equidade de género” e “injustiças sociais”. Para o Técnico, acrescentou, esta é “uma obrigação ética e moral” inerente ao seu papel enquanto instituição pública de Ensino Superior.
As três engenheiras distinguidas na edição deste ano têm percursos que convergem no objetivo de uma engenharia mais inclusiva. Na categoria Young Alumna, a Engenheira Diana Marques, finalista do doutoramento em Bioengenharia e Biociências, foi destacada pelo papel pioneiro na introdução da agricultura celular em Portugal. O seu percurso, iniciado “em dezembro de 2019”, abrange a criação dos primeiros filetes de peixe por bioimpressão tridimensional e o desenvolvimento de bio-tintas eletrocondutoras para bioimpressão de alimentos. Descreveu o seu campo como “uma ciência que transforma, evolui e protege”, acrescentando que “a igualdade de género não é apenas uma causa de mulheres, mas sim uma responsabilidade coletiva”.

Também na categoria Young Alumna foi distinguida a Engenheira Susana Monteiro, formada em Engenharia Informática e de Computadores do Técnico. O seu trajeto académico, culminou numa dissertação de mestrado desenvolvida em colaboração com a Google, dedicada à interoperabilidade segura entre C++ e Rust, um tema emergente nos sistemas de software de grande escala. Para Susana, esta distinção “homenageia todas as mulheres e o potencial que têm”. Lembrou ainda que, “no tempo de Maria de Lourdes Pintasilgo, as mulheres representavam 1% na educação” e que, em 2019, “28% das pessoas do Técnico eram mulheres”, e sublinhou que “a igualdade, mais do que a representação em números, deve ser medida em oportunidades”.

A categoria Role Model distinguiu a Engenheira Cristina Cachola, formada em Engenharia Química pelo Técnico, em reconhecimento de uma carreira de excelência no setor da energia, marcada por uma trajetória ascendente na Galp, que culminou na atual função de Diretora da Refinaria de Sines. O regresso ao Técnico, quase quatro décadas após o percurso académico, foi um momento marcado pela memória e pela emoção. Cristina recordou ter sido “a primeira mulher a assumir a liderança de uma refinaria em Portugal” e dirigiu-se às gerações mais jovens, incentivando-as a enfrentar desafios sem receio do erro, defendendo que “a liderança no feminino é uma liderança mais humanizada”.

Alexandre Bernardino, co-coordenador do Grupo de Diversidade e Igualdade de Género, revisitou a evolução das políticas institucionais desde 2016. O aumento expressivo de candidaturas ao Prémio Maria de Lourdes Pintasilgo em 2025 foi apresentado como um “sinal do crescente envolvimento da comunidade”. Destacou ainda que políticas como a dispensa de serviço a professores depois da licença de parentalidade ou a criação de ambientes inclusivos influenciam trajetórias profissionais, embora subsistam desequilíbrios estruturais. “O plano de jogo está desequilibrado historicamente”, observou, defendendo a necessidade de manter a discussão viva no espaço académico.
O evento contou ainda com a intervenção de Clara Raposo, vice-governadora do Banco de Portugal, que descreveu a sessão como “uma cerimónia com tanto significado”, defendendo que “todos os prémios foram verdadeiramente merecidos pelo extraordinário trabalho desenvolvido”. Alertando para o “risco de retrocesso em muitas áreas, nomeadamente na saúde e educação”, recordou que “a igualdade começa em casa” e expressou ter sentido “muita determinação nas premiadas de hoje”.
Cecília Rodrigues, vice-reitora da Universidade de Lisboa, encerrou a cerimónia com uma reflexão sobre o espaço académico enquanto motor de transformação. Identificou na sala “um ponto de convergências de várias revoluções”, reforçando que “a engenharia e o engenho não têm género” e que a única receita é “trabalhar o dobro, pensar mais à frente e nunca pedir licença para ser brilhante”, concluiu.
O Prémio Maria de Lourdes Pintasilgo distingue anualmente graduadas do Técnico em duas categorias: Alumna Role Model, dedicada a antigas alunas que concluíram o ciclo de estudos há mais de 15 anos e se destacaram pelo impacto profissional ou social; e Young Alumna, dirigida a recém-graduadas com menos de 27 anos, reconhecendo a qualidade científica da dissertação de Mestrado e o percurso académico.