Rui Mirra dos Santos tem apenas 24 anos, embora nas próximas linhas lhe possa parecer que tem mais. Trabalha na Microsoft Portugal, estando neste momento a desenvolver um projeto na Holanda. Tirou Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico, um percurso que no meio de tantas outras coisas lhe valeu um segundo lugar dos Prémios REN, entregues na semana passada. Para desenvolver a tese de mestrado – Estudo de previsão de um modelo económico não-linear de gestão de energia em edifícios inteligentes – que lhe valeu este galardão, Rui Mirra dos Santos rumou a Roskilde, na Dinamarca, e viveu 8 meses numa casa inteligente e alimentada a energia eólica.
Quando lhe perguntamos o porquê da escolha desta temática, na tese que foi avaliada com 19 valores, não deixa margem para dúvidas: antes de tudo e numa perspetiva mais abrangente é engenheiro de sistemas. “Adoro todos os aspetos da física e dá-me um prazer extremo usar abstrações sistémicas da realidade, possibilitando a integração de sistemas de diferentes tipos”, explica. “Essas abstrações permitem operar esses mesmos sistemas, de forma tão eficiente, que são atingidas performances extremamente superiores às que conseguiriam ser alcançadas se os operássemos como sistemas isolados”, acrescenta. A juntar a isto vem o facto de o alumnus do Técnico conceber “a Engenharia, como uma ferramenta para resolver os grandes problemas sociais” e de os temas do “problema energético e a descarbonização” sempre o terem sensibilizado. Assim nesta mescla de interesses e conhecimentos, achou que este “era o tema perfeito para juntar as minhas preferências mais técnicas às minhas preocupações como ser humano”, justifica.
Durante os meses que esteve na Dinamarca criou um algoritmo que mostra que um edifício pode perfeitamente funcionar com uma bateria que armazena energia de forma controlada, usando-a como e quando nos dá mais jeito. “O algoritmo de controlo desenvolvido considera previsões climáticas, considera preços de energia elétrica e recolhe dados reais de sensores que permitem medir as condições térmicas dentro do edifício”, aprofunda Rui Mirra dos Santos. Depois de “ingerir” toda essa informação, o algoritmo “decide quais as ações que deve enviar para os atuadores do sistema, que estão relacionados com o consumo elétrico”, vincula posteriormente. Assim é possível conseguir determinar o consumo “nos instantes temporais onde o preço da energia é menos elevado e reduzir o consumo quando é mais elevado, mantendo sempre as condições de conforto dentro do edifício”, remata o autor do algoritmo.
Quando se candidatou ao prémio sabia que tinha hipóteses de vencer, que a sua tese tinha “valor”. “Estava ciente de que o esforço, o empenho e a dedicação se traduziram em qualidade e que, por esse motivo, o meu trabalho reunia as condições científicas e metodológicas que me permitiam poder vir a ser um dos candidatos ao pódio”, partilha. Faz questão de afirmar que esta edição do Prémio REN foi “uma competição bastante rígida e equilibrada”, tendo à posteriori constatado “a imensa qualidade dos trabalhos dos meus colegas, pelo que todos os concorrentes estão de parabéns e a investigação portuguesa também”, frisa o alumnus do Técnico. Ganhou 6500 euros, mas para si o mais gratificante na entrega deste prémio “é ver que existe tanta gente, no nosso país, sensibilizada por este grande problema que o planeta (ainda) está a enfrentar”, vincula. “Portugal pode ser um dos países na linha da frente da resolução deste problema e pode ter uma enorme influência nessa solução – basta que um conjunto de pessoas capazes, apaixonadas e motivadas se juntem e trabalhem para esse fim”, vinca o engenheiro da Microsoft, que tão bem encaixa neste perfil.
Rui acredita piamente que “para que tenhamos um futuro renovável, duas transformações vão ter de acontecer: primeiro, a eletrificação; depois, a integração”. “Todos os pontos de consumo têm de ser flexíveis o suficiente para se moldarem à produção de energia. Para concretizarmos este fim, o armazenamento vai ser crucial, em qualquer que seja a sua forma”, frisa o alumnus do Técnico.
No futuro “ambiciona” criar a sua própria empresa, não porque sim, mas apenas se três coisas co-existirem num dado momento: “a ideia, o sentir-me preparado e a existência de mercado para algo necessário e benéfico para a sociedade”. Quando tentamos saber mais sobre isto, Rui Mirra dos Santos relembra e bem que “o segredo é a alma do negócio”. Esta sua vontade de criar algo está-lhe no sangue, afinal veio de uma família de músicos. Talvez a tenha herdado do avô, com o qual passou muitas tardes da sua infância e juventude numa oficina onde o mesmo transformava “torradeiras em aquecedores”. “Sempre vi o toque criativo como algo que devia fazer parte de tudo o que fazia, independentemente da tarefa”, assinala. No Técnico, posteriormente, percebeu que o horizonte onde pode aplicar essa minha veia criativa é bem mais lato do que pensava anteriormente.
Por falar em Técnico, considera-o como um dos maiores desafios da sua vida. Para o enfrentar com sucesso revela que é preciso desenvolver uma “fórmula química” que contenha os seguintes elementos: talento, trabalho (árduo) e (muita) força de vontade”. As características que melhor o caracterizam, tanto a ele como a “qualquer produto exportado pelo Técnico são a capacidade árdua de trabalho e a resiliência”, partilha Rui Mirra dos Santos. Tem na Engenharia uma paixão, e reitera que “nunca vou deixar de ser Engenheiro em tudo o que faço”. Porém recusa-se a entrar no velho padrão dos “produtos rotulados à saída de uma fábrica”. “A apropriação do conhecimento é tanto mais rica quanto maior for a diversidade dos sítios de onde ele provém, bem como da multiplicidade e da diversidade dos seus contextos”, frisa o alumnus. É, aliás, no desafio de fazer diferente que encontra a melhor maneira de se sentir vivo.