Desengane-se quem acha que o Pitch Bootcamp@Técnico é apenas um programa que coloca algumas das mais competitivas empresas em Portugal em contacto com os alunos da Escola. O evento funciona como um aglomerador de talento efetivamente e faz a importante ponte entre o mercado e a universidade, mas vai muito para além disso. Ética e inteligência emocional são componentes que além de presentes nos discursos, estão no trabalho levado a cabo. O talento e a confiança são as matérias-primas com que Miguel Gonçalves, CEO da Spark, tão bem trabalha ao longo dos dois dias do evento. A dificultar-lhe a tarefa estão o nervosismo, a introversão e os receios que caraterizam a generalidade dos alunos do Técnico, a ajudá-lo a vontade de aprender que também neles reside. “O programa é duro, intenso, longo, e estamos sistematicamente a trabalhar”, avisava logo no primeiro dia, desta 11ª edição, Miguel Gonçalves. Ao segundo dia, ainda que exaustos, a maioria dos 180 participantes fazia questão de lhe agradecer.
Pensar a carreira, fazer uma análise de mercado, analisar as empresas e formular uma proposta de valor mais forte são os desafios de um primeiro dia que começa bem cedo e cheio de expectativas. Ao longo das várias horas, cada atividade é planeada ao mínimo detalhe para ajudar a descobrir novas formas de abordagem às empresas, treinar ferramentas de comunicação, e para que não haja dúvidas das aptidões que podem fazer a diferença. “O Pitch Bootcamp é sobre aquilo que vocês podem fazer por vocês próprios”, ia lembrando várias vezes o CEO da Spark. É sempre com esta animosidade contagiante, crente de todo o potencial que tem à sua frente que passa à próxima atividade. Recordando que nem sempre o óbvio é o mais importante, convida os participantes a uma viagem por si mesmos, teimando em pedir que não “sejam os vossos próprios inimigos”. Aos poucos, e numa descoberta nem sempre fácil, as telas brancas passam a estar repletas de post-its que refletem as aptidões e as experiências de vida de cada um, que por mais exíguas que pareçam dizem tanto sobre quem as escreveu.” Vocês têm tanto valor aí dentro, tanta coisa única para oferecer ao mercado”, não se cansa de reiterar Miguel Gonçalves, até que ninguém na sala teime em duvidar.
O painel “Lessons Learned” com que se encerra o primeiro dia, 1 de março, é uma espécie de lufada de inspiração para o dia seguinte. Depois de pensarem e trabalharem tanto sobre si próprios é altura dos participantes se deixarem levar pelas experiências, conselhos e ensinamentos dos profissionais que sobem a palco. Com carreiras de sucesso, sem qualquer subterfúgio e com muita frontalidade à mistura, Sofia Tenreiro (Cisco Portugal) Manuel Lopes da Costa (BearingPoint) e Pedro Oliveira (BP) não restringiram acesos à curiosidade. O tempo voou enquanto a conversa saltitava entre as decisões inesperadas, as prioridades que se foram alterando ao longo dos tempos, o mercado profissional cada vez mais global, o impacto que cada um pode ter através daquilo que faz e também a importância das equipas que se integra ou lidera. A receita para uma carreira de sucesso foi várias vezes um “lugar-comum” nas dúvidas levantadas pelos participantes, e as respostas dos três oradores passaram sempre pela importância da “felicidade”. “Não há mal nenhum em quereres ter uma carreira estável. O importante é ires questionando se és feliz a fazer aquilo que fazes”, declarava Pedro Oliveira. “E ser feliz não significa que não vão ter que sofrer, trabalhar duro. Ser feliz é ter uma meta e sabermos que estamos perto e a fazer tudo para a atingir, é fazerem aquilo que gostam ao longo deste percurso” complementava Manuel Lopes da Costa. “Eu não tenho qualquer dúvida que o esforço e o trabalho árduo conduzem ao sucesso mais cedo ou mais tarde. Portanto ele vai bater à vossa porta, até lá definam prioridades, vivam bem com elas e rodeiem-se de pessoas que vos apoiem”, rematava Sofia Tenreiro.
O segundo dia, 2 de março, começou mais cedo do que preguiça e o nervosismo quereriam. As olheiras e a ansiedade desarrumavam ligeiramente a indumentária cuidada que todos fizeram questão de trazer. Aos poucos, os muitos representantes das empresas começam a chegar aumentando a adrenalina e desalinhando algumas ideias. Ao longo do dia mais de 220 profissionais de 150 empresas passaram pelo evento, sendo muitos deles antigos alunos do Técnico. Foi à generosidade inerente a esta presença que Miguel Gonçalves fez questão de agradecer: “Podíamos estar em Cascais a beber mojitos, mas estamos aqui a fazer o país acontecer. Obrigada por essa vossa disponibilidade”. Dando algumas dicas sobre os minutos que se seguiam, o CEO da Spark, vincava ainda o talento que foi desvendando ao longo destes dias: “Estes miúdos são mesmo bonitos, notáveis e têm o mundo inteiro na cabeça”. E foi assim, com as expectativas em alta e os egos no sítio certo que se seguia para o derradeiro momento dos pitchs.
André Gonçalves, consultor da Winning, foi um dos muitos antigos alunos que aceitou o convite para estar do lado dos caçadores de talento. A participação neste tipo de evento é algo que faz de forma recorrente uma vez que integra a equipa de recrutamento da empresa. Ainda assim vir ao Técnico é diferente como partilha: “Faz ainda mais sentido fazer esta procura de talento no Técnico porque esta é a minha casa e eu sei que as pessoas que saem daqui têm qualidade na formação, e também porque o tipo de perfil destes alunos é o mais procurado do mercado”. Também Mafalda Flores, antiga aluna de Engenharia e Gestão Industrial, fez questão de estar presente. Veio a título pessoal, incitada pela “curiosidade de ver o que são estes novos alunos”. Além da ótima organização do evento, assume-se perplexa não com o “talento que sei que domina ou alunos do Técnico”, mas com a insegurança com que tem vindo a ser confrontada. “Eles têm um enorme talento, mas não conseguem entender isso, e o receio acaba por limitar a capacidade de se mostrarem. E por isso é tão importante estarmos aqui hoje para acalmar medos e para lhes lembrar do quão extraordinários são”, destaca.
Os conselhos e a aprendizagem que dominaram o dia anterior são revistos nas trocas de ideias que antecedem os pitchs. Há quem não esqueça por nada a frontalidade que Miguel Gonçalves pediu que tivessem para com os companheiros de aventura, ajudando-os sempre que possível. Nas mesas, frente-a- frente com os profissionais, o discurso transita entre o percurso académico, as aspirações profissionais, os sonhos e os gostos pessoais. A ordem fica ao critério de cada um e o nervosismo prega, invariavelmente, sempre uma partida aqui ou ali. Pelo meio e até como forma de fintar a ansiedade, os profissionais vão intervindo, dando sugestões e satisfazendo dúvidas. Todos os detalhes são apontados e incluídos no feedback final onde os elogios são condimentados com algumas críticas construtivas. Nem sempre o desejado foi dito, mas até isso foi lembrado. Há do lado de quem ouve uma genuína vontade de conhecer, de ajudar, e tantas vezes de rever mais tarde.
Apanhamos Manuel Ramos, aluno de Engenharia e Gestão de Energia, a meio de um pitch. O dólar que tinha em cima da mesa e o à-vontade com que construía a sua apresentação, despertou o desejo de querer mais – tal como acontecera com os profissionais que ocupavam a sua mesa. No final, depois de distribuir vários Técnico Business Cards, explicou-nos a tranquilidade e a nota com que se fez acompanhar. “Foi-me dito para trazer um objeto com o qual me identificasse. E lembrei-me do meu marcador de livros: a nota que trouxe de Washington e que diz muito sobre mim, juntando as viagens com os livros que são as minhas paixões”. Este não é o primeiro Pitch Bootcamp de Manuel e rapidamente esclarece porque fez questão de repetir a experiência: “A primeira vez foi muito importante para mim porque me fez perceber que estava a pensar no futuro tarde demais, mas foi de tal forma bom que não me desmotivou, deu-me sim força de começar a fazer algo por isso”. Desta feita o objetivo é mesmo arranjar emprego e também “medir o meu progresso desde o ano passado. Sinto que cresci imenso desde esse dia até agora”, reitera.
A certeza de que valeu a pena é transversal a todos os participantes, e desvenda-se nos sorrisos de orelha a orelha, nos cartões de visita que levam nas malas, na postura de confiança que lhes está estampada. “Os ensinamentos que se levam daqui são fenomenais. Percebemos que não nos devemos comparar aos outros, devemos sim comparar-nos a quem éramos ontem e perceber como fomos capazes de evoluir. As coisas são relativizadas, o nosso talento é que não”, conclui Manuel Ramos. E só por esta perceção já terá valido a pena – para ele, para os colegas e para quem a plantou.