Campus e Comunidade

Francisco Lufinha, o antigo aluno do Técnico que surfa recordes

O alumnus é um dos nomes sonantes do kitesurf e acabou por aliar a sua vida profissional à sua grande paixão: o mar.

São poucos os adeptos de desportos náuticos que não conhecem o nome de Francisco Lufinha, o recordista mundial de kitesurf. Além de ex-campeão nacional da modalidade, o atleta fixou em 2017 o novo recorde mundial da maior viagem de kitesurf em dupla ao percorrer 1.646 km, juntamente com Anke Brandt, e é também recordista mundial da maior viagem sem paragens, depois de em 2015 ter ligado Lisboa à ilha da Madeira, numa travessia de 862 quilómetros que durou 48 horas. O que poucos sabem é que por trás da tamanha perseverança, capacidade de adaptação e da determinação que caracterizam o recordista está um engenheiro do Técnico, que não esquece a capacidade de resolução de problemas e o rigor que a formação em Engenharia lhe deu.

“Lufada”, como é tratado pelos amigos, tinha apenas 15 dias de vida quando os pais o levaram pela primeira vez para o mar, e a vontade de lá voltar nunca mais o abandonou. O mar é em simultâneo o seu refúgio e a sua fonte de adrenalina, e percebeu cedo que também poderia passar lá um dos seus grandes talentos. “Ganhei um equilíbrio e à vontade junto do Mar de tal forma que quando estou mais de 2 ou 3 dias sem ver o mar começo a ficar nervoso”, confessa. Com apenas 6 anos vencia a volta a Portugal à Vela com os pais, aos 18 anos liderava o ranking nacional de 420, e com apenas 22 anos sagrava-se campeão nacional de kitesurf, mesmo que nessa altura já tivesse também que surfar a exigência do Técnico.

No momento em que teve que escolher por onde passaria o seu futuro, Francisco Lufinha não teve dúvidas de que teria de ser o Técnico, uma escolha de que nunca se arrependeu. “Escolhi o Técnico por achar que é a melhor e mais bem-conceituada universidade de Engenharia”. Acabaria por se licenciar em Engenharia e Gestão Industrial, mas a sua primeira escola foi Engenharia Informática e Computadores, que frequentou durante dois anos. “Gosto muito de programar e ainda o faço em vários projetos, mas decidi mudar para um curso mais abrangente e com gestão, numa ótica de poder gerar mais oportunidades”, recorda.

O facto de ser um dos melhores alunos da turma não o socorria nas chamadas de atenção quando chegava ao campus de Oeiras do Instituto Superior Técnico de chinelos, pronto para ir praticar kitesurf depois das aulas. Desses tempos, guarda as melhores recordações, e confessa até que “foi a altura em que me senti mais livre”. “Voltava atrás para fazer tudo outra vez e ainda acrescentava umas coisas”, adiciona Francisco Lufinha.  Aficionado pela matemática e pela lógica, confessa que as maiores dificuldades no Técnico surgiam “nas cadeiras teóricas, com poucos cálculos”. “A melhor recordação foi de uma forma geral ter aprendido a puxar pela cabeça e conseguir organizar-me de forma a ter boas notas enquanto competia em Kitesurf e viajava pelo mundo como nunca”, afirma o alumnus.

Durante o seu percurso no Técnico, conseguiu ser campeão nacional em 2005 e vice-campeão no ano seguinte. Em 2007, a conquista seria no campo académico, com o término do mestrado. Quando lhe perguntamos como conseguiu conciliar e manter o desempenho em ambas as frentes, oferece-nos uma resposta simples: “É uma questão de disciplina. Ter uma vida tão intensa no desporto e com tantas viagens, fazia com que estudasse a 200% quando era altura disso”, relembra.

A primeira oportunidade de trabalho aparecer-lhe-ia facilmente, tendo em conta a boa média que detinha, acabando por aceitar a oferta que lhe foi feita por uma consultora que foi ao Técnico caçar talentos. Da consultoria, Francisco Lufinha passou para o Marketing Estratégico onde sentiu que as suas capacidades analíticas foram muito úteis, chegando mesmo “a automatizar processos que demoravam 2 dias a fazer e com o meu código passaram a demorar 2 segundos”, lembra.  Apesar do sucesso, o antigo aluno do Técnico rapidamente perceberia a sua incompatibilidade com os processos repetitivos e o ambiente muito formal das grandes empresas. “Gosto de trabalhar relaxado, sem fato e gravata, e ter liberdade para gerir o meu tempo dentro e fora do trabalho”, afirma.

Tendo a perfeita noção de que a sua motivação reside em “desafios arrojados, projetos ambiciosos e pioneiros”, o alumnus do Técnico acabaria por decidir aliar o seu futuro profissional com a forte ligação ao Mar que o carateriza, criando a “Lufinha, LDA”, uma empresa que atua em 6 áreas de negócio distintas, mas todas elas ligadas ao mar. Sobre o empreendedorismo, Francisco Lufinha confessa que o maior desafio  que lhe está inerente é a ansiedade, e que “por vezes vem aliada a um certo isolamento”. “É ótimo ter liberdade para fazer o que quero e ser dono do meu nariz, mas, por outro lado, trabalho agora mais do que nunca, seja a horas ‘normais’ ou pela noite/fim de semana dentro”, partilha. A vontade de empreender, de criar, de deixar marca que define Francisco Lufinha está também patente no projeto “Portugal é Mar” ou “Kitesurf Odyssey”, ambos criados pelo alumnus.

“Só sendo assim, e conhecendo bem as leis da física é que tenho conseguido alcançar estas conquistas arrojadas em alto mar e em terra firme”

Por enquanto, Francisco Lufinha é ainda, e desde julho de 2015, detentor do recorde mundial do Guinness da maior viagem de Kitesurf sem paragens: 862 km em 48 horas sem parar em cima da prancha de Kitesurf entre Lisboa e a Madeira. Espera que assim seja por muito tempo, “para não ter sequer pensamentos de tentar fazer uma proeza do estilo”, graceja.

Esta adrenalina que pauta as aventuras de que tem sido protagonista gera também medo, o mesmo que o antigo aluno do Técnico usa como impulso para que nada fique ao acaso no planeamento que faz. “Nunca estou menos de 1 ano a preparar uma odisseia destas. Por outro lado, no meio do mar, quanto mais cansado fico, menos neurónios são destacados para o medo e o desafio vai ficando cada vez mais relaxado a nível psicológico”, partilha.

Além do treino intenso, fica também a cargo do alumnus a restante envolvente destes projetos, desde o desenvolvimento, organização, a procura de financiamento, e a execução. “O bom de tanto trabalho e suor largado durante a preparação é que se transforma numa motivação enorme para continuar rumo ao objetivo, nos momentos mais difíceis em que penso em desistir”, confessa.

Com as experiências e os recordes, chegam também inúmeras recordações, algumas simples de cobiçar. “Desde ter um fogo de artifício à minha espera a meio do meu primeiro desafio às 3 da manhã, golfinhos a saltar por cima da prancha a meio da noite, ficar perdido sem prancha às escuras durante 30min, sobreviver a um atropelamento pelo meu barco de apoio às 2 da manhã, fazer corridas com peixes-voadores, etc.”. “Tudo me marcou muito”, vinca Francisco Lufinha.

A paixão e a procura constante de adrenalina e de novos desafios não fazem o alumnus do Técnico cessar e, por isso mesmo, está agora a criar o próximo desafio, “que será bem mais arrojado e de Portugal para o mundo”, como refere o próprio.  “Quero construir um barco rápido, leve e que seja movido a kite, aerogeradores, solar, hidrogénio… Ainda não sei bem. Tenho que falar com potenciais patrocinadores e com universidades O Técnico será uma delas, claro! A inovação e sustentabilidade do oceano é o que procuro promover pelo mundo fora”, adianta.

Francisco Lufinha considera- se “muito resiliente”, algo que tem sido determinante para levar a bom porto os seus projetos, tantas vezes considerados impossíveis por outros. “Gosto de arrojar e isso tem-me ajudado”, aponta. A estas caraterísticas juntam-se as capacidades de raciocínio, de trabalhar em equipa, a disciplina e o rigor que adquiriu no Técnico e que considera essenciais seja qual for o caminho profissional que se siga.  “Só sendo assim, e conhecendo bem as leis da física é que tenho conseguido alcançar estas conquistas arrojadas em alto mar e em terra firme”, declara.