Entusiamo foi o tom que marcou as opiniões no debate sobre a proposta de alteração do modelo de ensino aprendizagem do Técnico que decorreu, na passada sexta-feira, no Centro de Congressos do “campus” da Alameda. Uma mudança necessária que vai implicar muitos desafios de implementação foi o alerta deixado por diversos participantes do debate.
Arlindo Oliveira, presidente do Técnico, abriu a sessão sublinhando que “no Técnico como em todas as universidades existe uma inércia” em relação à mudança no ensino o que leva a que “o modelo não se tenha alterado, muito, nos últimos 30 anos”. “Obviamente que esta é uma limitação importante porque os jovens, hoje, são diferentes na forma como absorvem o conhecimento”, acrescentou. Na introdução do debate, Arlindo Oliveira, sublinhou que a Universidade é uma das três instituições que foram feitas para se manter à passagem dos séculos para além da Igreja e do Exército”.
Mas a academia tem que “adaptar-se aos tempos”, apelou. Um processo que “vai ser particularmente desafiante”, sublinhou. Até porque há propostas feitas no modelo Técnico 21 que “contrariam muitas das coisas que as pessoas na universidade acham que não devem mudar”, concluiu.
Foi a consciência desta necessidade de mudança que levou o presidente do Técnico a convidar alguns docentes a participar numa comissão de trabalho para “para pensar toda a problemática do ensino e dos seus conteúdos”, tendo “o resultado superado em muito a expectativas”, afirmou Arlindo Oliveira. As propostas apontadas no modelo Técnico 2021 feito por esta comissão foram debatidas, sexta-feira passada, numa mesa que contou com a participação de Marçal Grilo, ex-ministro da Educação e antigo docente do Técnico, Isabel Vaz CEO do Grupo Luz Saúde e antiga aluna do Técnico, António Feijó, vice-reitor da Universidade de Lisboa e Gonçalo Azevedo, presidente da Associação de Estudantes do Técnico.
O debate foi precedido de uma apresentação do coordenador do grupo de trabalho, Pedro Brogueira, que resumiu as 12 ideias-chave do documento. “A formação de base sólida em engenharia e ciências fundamentais tem que manter-se no ADN do Técnico” e “a formação faz-se aprendendo não ensinando, o que significa que o ato de aprendizagem tem que ser uma ação ativa”. Depois “há que permitir percursos académicos flexíveis” e assegurar que “a componente humanista faça parte da formação em engenharia”. “As competências transversais têm que ser incluídas nas unidades curriculares”, sublinhou Pedro Brogueira para quem “é necessário integrar conhecimento”. Para isso “os anos letivos terão que ser organizados de forma a potenciar maior foco e trabalho contínuo, dando tempo aos alunos para pensar e refletir”. “Uma escola avançada tem que ter um ambiente internacional”, é outra das ideias chave. “Formação em empreendedorismo e inovação e garantir-se a ligação da academia às empresas”, são outras das linhas propostas. Para concretizar tudo isto “têm que ser garantidas boas condições de ensino, de estudo e vivência para a comunidade académica”. E implementar várias mudanças. O modelo aponta para a criação de “um curso geral de ciências da engenharia, um 1º ciclo lecionado em inglês”, o que implicará “dividir os mestrados integrados em dois ciclos, para que haja mais mobilidade entre os ciclos”, afirmou Pedro Brogueira. Depois há que “manter a formação base sólida o que significa que um terço do 1º ciclo será dedicado às ciências fundamentais”, acrescentou. Para o coordenador do grupo de trabalho há que assegurar que “as ciências sociais e humanidades entram no curso como cadeiras de opção” oferecidas no Técnico ou em outras unidades orgânicas da Universidade de Lisboa. Todos os cursos terão que garantir flexibilidade em 25% do seu percurso. Prevê-se, ainda, que “sejam reconhecidos créditos através de experiências do portfolio pessoal”. O curso terminará com uma tese científica que poderá ser substituída por um projeto numa empresa que terá que valer 42 ECTS.
Depois da apresentação do modelo seguiu-se o debate onde surgiram muitos elogios à proposta, mas também algumas dúvidas quanto à implementação das medidas apresentadas por alunos e docentes.
Marçal Grilo, ex-ministro da Educação valorizou a proposta reforçando ser “preciso haver abertura para introduzir nos cursos especializados como engenharia, uma componente humanística”. Na sua intervenção recordou que quando frequentou o curso, o Técnico era “essencialmente uma escola técnica para formar grandes técnicos para trabalhar em coisas técnicas”. “O mundo hoje é muito diferente” e os “engenheiros são a base da mudança, não apenas porque saibam muito de tecnologia, mas porque são capazes de perceber os problemas do mundo e ajudar na sua solução”, acrescentou. Por isso introduzir na sua formação “a componente humanística é absolutamente essencial”. Assim como reforçar a internacionalização porque “os estudantes precisam de ter asas para voar nas suas ambições e expetativas, mas também para qualquer sítio do mundo”.
António Feijó, vice-reitor da Universidade de Lisboa, subscreveu a opinião de Marçal Grilo afirmando que o Técnico deverá “criar currículos que previnam esse excesso da natureza vocacional, formando engenheiros com mais preocupações humanísticas”. Elogiando a proposta de “flexibilidade curricular e competências transversais” que constam do modelo Técnico 21, sublinhou que “a robustez científica está assegurada”. Mas a aplicação do modelo “será um enorme desafio para os docentes” do Técnico.
Já a CEO do Grupo Luz Saúde, Isabel Vaz, disse identificar-se com todas as propostas apresentadas. Elogiando o documento, sublinhou a preocupação que há que ter em “ensinar a resolver problemas e a aprender para o resto da vida”. Valorizando a sua formação do Técnico, Isabel Vaz, destacou a preocupação em “criar projetos multidisciplinares” que se integrem dentro da própria universidade. Tal como nas empresas, “esta proposta cria um desafio brutal aos departamentos do Técnico e à universidade para que saiam dos seus silos e comecem a cooperar”, alertou. Isabel Vaz desafiou, ainda, o presidente do Técnico, Arlindo Oliveira a ajudar na “implementação da mudança e no processo de abertura da academia às empresas”.
Também o presidente da associação de Estudantes do Técnico, Gonçalo Azevedo, afirmou que “a opinião generalizada dos colegas sobre o documento em discussão é positiva”. Os estudantes consideram que “a atualização tem que acontecer para que o Técnico se mantenha uma escola competitiva”. “A mentalidade dos que agora entram no IST é diferente do que acontecia há 20 anos atrás” e o modelo de ensino está “pouco voltado para a adaptação aos problemas reais”, sublinhou o representante dos alunos.
Destacando a proposta de “reconhecimento curricular das atividades extra- curriculares” que surge no documento, Gonçalo Azevedo sublinhou que alguns colegas estão “preocupados” com a passagem dos cursos para o modelo 3+2, “porque isso coloca o risco de aumentar as propinas para o 2º ciclo”. Mas “os estudantes estão entusiasmados com esta proposta de mudança”, concluiu.
Durante as questões da audiência, Pedro Garvão um dos representantes dos alunos no Conselho Pedagógico, apelou “aos serviços do Técnico” que assumam a necessidade de mudança, porque “não é preciso apenas mudar a mentalidade dos professores, que só por si, já vai ser uma coisa complicada”
A reitora do Instituto Universitário de Lisboa, Maria de Lurdes Rodrigues, que também esteve presente sublinhou que leu “com enorme agrado a proposta” que revela que “o Técnico continua com a capacidade de inovar”.
Já o presidente da Associação de Estudantes, Gonçalo Azevedo afirmou que “caso a escola decida ir para a frente com esta proposta é preciso que todos estejam preparados”, sublinhando que o Técnico “é perfeitamente capaz de aplicar” estas mudanças se decidir “que deve seguir em frente”.