Foi inaugurada esta segunda-feira, 30 de agosto, a infraestrutura micro-hídrica que resulta de um projeto-piloto que contou com a participação de uma equipa de investigadores do Técnico, realizado no âmbito do grande projeto europeu REDAWN do programa INTERREG. Localizada no empreendimento agroturístico do Hotel Moleiro da Costa Má, a infraestrutura assume-se como uma solução sustentável e flexível em termos energéticos, gerando energia sustentável como alternativa à energia da rede elétrica nacional, sempre que for possível.
O projeto conjuga na perfeição a engenharia aplicada, a sustentabilidade e os recursos naturais, procurando aproveitar algum potencial hídrico existente no rio Mau que abastece o empreendimento, e onde outrora existia um moinho. O potencial hídrico é constituído a partir da queda disponível proporcionando energia potencial, transformada em energia elétrica através da micro-hídrica.
No projeto foram aplicados os conhecimentos multidisciplinares da equipa do Instituto Superior Técnico, coordenada pela professora Helena M. Ramos, docente do Departamento de Engenharia Civil, Arquitetura e Georrecursos (DECivil), investigadora do CERIS – Investigação e Inovação em Engenharia Civil para a Sustentabilidade e também líder da Work Package 7 do REDAWN sobre as instalações piloto. Ao projeto aliou-se a IG Energy, que como recorda a professora Helena M. Ramos, “prontamente reuniu todos os elementos necessários para que a solução pudesse prosseguir no sentido do seu estudo, na realização de testes preliminares em laboratório, e posteriormente para a sua implementação in situ”.
A investigadora do CERIS partilha que o “Hotel Moleiro da Costa Má já tinha interesse em fazer a transição energética para formas mais sustentáveis de energia baseadas em recursos renováveis”. Esta vontade acabaria por ser conciliada da melhor forma com o projeto REDAWN, dando origem a esta instalação-piloto.
A instalação acabaria por ser construída em tempo recorde, cerca de dois meses e meio, graças a um imenso empenho da equipa do Técnico e do consórcio da IG Energy, envolvida em cada um dos processos e na construção dos componentes: desde a tomada de água, conduta forçada até à central, incluindo a fabricação da turbina e toda a parte de construção civil, mecânica e eletrotécnica do projeto, mostrando que “é possível conceber, executar, testar e implementar, tudo de forma competente e em convergência com os objetivos definidos de produção de hidroenergia”, como realça a líder da equipa.
O projeto teve por base muito estudos e publicações anteriores da equipa de investigação do DECivil / CERIS sob a orientação da professora Helena M. Ramos, e em colaboração com a equipa do professor Paulo Branco, do Departamento de Eletrotécnica e de Computadores (DEEC). “Foram desafios que exigiram muita investigação para podermos compreender e responder de forma conhecedora relativamente ao comportamento da interação hidráulica e produção elétrica”, salienta a professora Helena M. Ramos.
A micro-hídrica com apenas uma turbina de reação, para baixa queda, irá satisfazer cerca de 55% das necessidades energéticas do empreendimento. A docente do Técnico realça a importância desta contribuição “para a descentralização e transição energéticas e a neutralidade carbónica, dando o mote para ser aplicado no sector da água”. Estima-se um retorno do investimento realizado em cerca de 5 anos.
A energia hídrica tem um papel essencial na transição energética, não só pela neutralidade carbónica, mas também pela flexibilidade de integração de outras fontes renováveis e da sua capacidade de armazenamento. “Existe um potencial significativo de implementação de micro-hídricas nos sistemas hídricos da região atlântica e estima-se que em Portugal possa atingir valores da ordem dos 30 MW de potência a instalar nas redes de água, sem considerar os processos industriais”, evidencia a professora Helena M. Ramos.
A implementação de micro-hídricas permite uma produção de energia de forma descentralizada, tanto em redes de abastecimento para consumo humano, como em redes de drenagem, em sistemas de irrigação e em cursos de água que apoiem os processos industriais. É possível ter diferentes tipos de micro-hídricas, nomeadamente de baixa queda e elevado caudal, ou elevada queda e caudais menores, para o mesmo valor de potência instalada, o que cria soluções flexíveis e facilmente adaptáveis a cada caso de estudo.
Um exemplo a seguir
A instalação piloto servirá de exemplo no sector da água, nos processos industriais, bem como para empresas que tenham interesse em adquirir e implementar essa tecnologia. Sempre que existir interesse em aplicar esta tecnologia e o estudo hidrológico, hidráulico, ambiental e socioeconómico o viabilize, a equipa do Técnico está disponível para voltar a arregaçar as mangas, dando o devido apoio a esses projetos.
Segundo a investigadora do CERIS, “as soluções integradas começaram a tomar relevância com vários estudos publicados e neste novo paradigma de neutralidade carbónica”. “O sector da água enfrenta custos elevadíssimos de consumos de energia que correspondem, em muitos casos, a cerca de 80% dos seus gastos, o que veio abrir esta janela de oportunidade de nexus água-energia”, destaca, ainda, a professora Helena M. Ramos.
Esta é a última instalação piloto do projeto REDAWN, de um total de 5. “Foi construída uma instalação num sistema de rega em Espanha, que veio substituir um gerador a diesel; duas num sistema de abastecimento em França, sendo uma numa estação de tratamento de águas para reduzir os consumos energéticos associados, e outra numa conduta que serve para carregar telemóveis numa paragem de autocarro junto a uma escola; e duas em Portugal, sendo a primeira, um projeto-piloto para uma casa familiar que usa todo o equipamento elétrica incluindo o automóvel e esta segunda, no empreendimento agroturístico do hotel Moleiro da Costa Má”, elenca a docente do Técnico. “Todas pretendem dar contributo para a eficiência e transição energética, assim como a neutralidade carbónica neste paradigma associado às alterações climáticas”, realça, ainda, a professora Helena M. Ramos.
Terminado o projeto, a professora Helena M. Ramos é a porta-voz da “enorme satisfação de todos os parceiros do projeto REDAWN, em especial de toda a equipa que colaborou na conceção, nos testes laboratoriais e na implementação de engenharia prática desta solução”. Após a data de conclusão deste projeto europeu, a equipa está ciente das oportunidades que dele advêm e de todo o potencial que reside nesta solução energética sustentável e amiga do ambiente e por isso sentem que “estas instalações piloto vieram criar maior confiança no futuro mercado das soluções hídricas”.
Para terminar, e porque esta é uma das lições subjacentes a este projeto, a docente do Técnico lembra que “nada é impossível e tudo se faz, se adapta e transforma em soluções melhores e mais sustentáveis”. Caso tenha dúvidas de que assim é a série de vídeos produzidos pelo projeto REDAWN tratará de as dissipar.