A importância do oxigénio na nossa sobrevivência e o seu impacto no nosso corpo é incontornável e estudada há vários anos. Porém, os investigadores William G. Kaelin Jr., Sir Peter J. Ratcliffe e Gregg L. Semenza, galardoados este ano com o Prémio Nobel da Medicina, quiseram ir mais longe na exploração desse impacto, tentando perceber como é que as células reagem e se adaptam à disponibilidade do oxigénio. O impacto da descoberta é incontornável na investigação que se faz hoje em dia e que ajuda a combater uma vasta panóplia de doenças como a anemia e o cancro. No Técnico esse impacto não é exceção, e o trabalho desenvolvido pelo grupo de investigação em engenharia de células estaminais (SCERG) é prova disso.
Desde o início do século XX, que se sabe que a queda dos níveis de oxigénio provoca um aumento na produção de glóbulos vermelhos do sangue. A novidade das linhas de investigação dos três laureados reside no facto de estes terem descoberto que o factor de indução da hipoxia (HIF) – uma proteína que tem o poder e a capacidade de regular o nível de expressão de genes em resposta a baixas concentrações de oxigénio – é um mecanismo em que as células detetam oxigénio. Assim, sempre que as células ficam com pouco oxigénio, o HIF surge para regular o nível de expressão dos genes necessários para fabricar mudanças nas células, permitindo que as mesmas sobrevivam com pouco oxigénio. Os três investigadores descobriram também como é que o HIF é controlado e se mantém em silêncio sempre que a disponibilidade de oxigénio não é baixa.
“Existem várias doenças, tais como o cancro, em que o oxigénio apresenta um papel central. A partir do momento em que se conhecem os mecanismos moleculares que regulam o papel do oxigénio no desenvolvimento destas doenças, poderão ganhar-se novos alvos para desenvolver novos medicamentos que irão atuar na doença ativando ou inibindo estes mesmos mecanismos moleculares”, explica a professora Margarida Diogo, enfatizando a importância das descobertas reconhecidas com o Prémio Nobel 2019.
No iBB, mais especificamente no SCERG têm vindo a ser desenvolvidos “desde há alguns anos a esta parte vários estudos sobre o efeito dos níveis de oxigénio na manutenção e diferenciação controlada in vitro de diferentes tipos de células estaminais, tais como as células estaminais mesenquimatosas e as células estaminais pluripotentes”, como partilha a investigadora do grupo e docente do Técnico, professora Margarida Diogo. “O que temos verificado ao longo dos anos é que é possível, por exemplo, tirar partido da utilização de baixos níveis de oxigénio para obter uma maior proliferação ou uma diferenciação mais controlada e eficiente deste tipo de células estaminais no laboratório”, vinca a investigadora do iBB. Atendendo ao estado da arte atual na área da engenharia de tecidos, a professora Margarida Diogo acredita que estas descobertas poderão agora “também eventualmente contribuir, ainda que indiretamente, para o desenvolvimento de novos sistemas de cultura in vitro mais controlados e eficientes para “a produção de organóides a partir de células estaminais humanas e sua manutenção”, de forma a “serem utilizados como modelos pré-clínicos para a pesquisa de novos fármacos bem como para a modelação de doenças”, salienta a professora.
Para a professora Margarida Diogo, a atribuição deste prémio trará “certamente ainda mais para os holofotes esta área de estudo e o interesse da indústria farmacêutica” devendo ser possível desenvolver de forma mais racional novos medicamentos que irão ter como alvo estes mecanismos.