“Esta tarde de trabalho sobre a discussão da política europeia para o avanço da Física de Partículas é bastante relevante”, disse a professora Helena Pereira, presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), na abertura do evento “Portugal-CERN-Europa: Ciência e Tecnologia nas próximas décadas”. As palavras da presidente da FCT confirmar-se-iam ao longo do evento que apesar de ter como mote o debate desta atualização, se revelou uma oportunidade ímpar para aprender mais sobre a área, entender o papel de Portugal no presente e no futuro da Física de Partículas, e ainda assinalar as oportunidades que residem na terapia de protões. O evento decorreu esta quinta-feira, 2 de julho, no Campus Tecnológico Nuclear do Técnico e apesar das limitações à audiência presencial, foram mais de uma centena os que se juntaram à emissão digital.
Na sua intervenção, a professora Helena Pereira faria questão de elogiar e realçar “o trabalho continuado da comunidade de investigadores portugueses nesta área”, assim como a colaboração intensa e profícua com o CERN, quer da comunidade científica, quer por parte de algumas empresas nacionais que fornecem serviços e materiais à organização. “Os grupos de investigação portugueses têm tido uma ação importante e continuada de envolvimento com o CERN, quer em termos de investigação, participando nas diferentes experiências que têm ocorrido ao longo destes últimos anos. Quero também evidenciar a participação de relevo da nossa comunidade em estágios tecnológicos de formação avançada de engenheiros, e não só”, realçava a presidente da FCT.
Revelando que visitou pela primeira vez o CERN no final do ano passado, a professora Helena Pereira não pôde deixar de partilhar o fascínio que a invadiu “pelo que vi, e mais ainda pelo que representa a investigação nesta área e o modo como é feita”, referia. “Planear grandes experiências com infraestruturas enormes e complexas que envolvem áreas temáticas muito diferentes, para um horizonte temporal muito longínquo, é de uma enorme humildade”, complementou a presidente da FCT.
Expressando a sua alegria com a realização deste evento no campus do Técnico e pegando um pouco no discurso da presidente da FCT, o presidente do Técnico, professor Rogério Colaço, realçava que “em Portugal, e no Técnico em particular, há uma grande tradição de investigação em Física de Partículas”. Enfatizando que esta capacidade instalada deve ser aproveitada “tanto pelo Técnico como pelo país”, o presidente do Técnico lembrava que existe um “sonho” que tira proveito e disponibiliza estas competências à sociedade e ao país: a construção da clínica de terapia de protões no CTN. “Neste momento, acredito que temos todas as condições para avançar com este sonho, porque na minha perspetiva ter competências, meios e condições para o fazer é o passo mais importante”, declarou o presidente do Técnico. “Esta sessão é também uma oportunidade para lançar esta discussão, apresentar um pouco este sonho, e mostrar à comunidade a sua importância”, reiterava.
Caberia ao professor Mário Pimenta, delegado de Portugal ao Conselho do CERN e presidente do Laboratório de Instrumentação e Partículas (LIP), evidenciar os pilares em que assenta esta estratégia, o que a mesma significa para a Europa e para Portugal. Depois de uma perspetiva histórica sobre a criação desta organização, o docente exploraria o papel da comunidade de cientistas portugueses dentro desta. “Estão registadas na base de dados do CERN de nacionalidade portuguesa 235 pessoas”, apontava o professor Mário Pimenta.
“Os sonhos, os desafios e as oportunidades na área da Física de Partículas continuam na Europa e em Portugal”, dizia a determinada altura o professor Mário Pimenta a propósito da estratégia recentemente aprovada para a Física de Partículas. “Esta estratégia fala do futuro, vem dar uma perspetiva às novas gerações e lança enormes desafios tecnológicos”, vincava ainda o docente. O presidente do LIP fez também questão de salientar a importância do centro de tratamento de protões, revelando alguns dos avanços que têm surgido em torno deste “sonho”- como também o quis chamar. “Foi criada uma Associação Portuguesa de Proto-Terapia e Tecnologias Avançadas para a Prevenção e Tratamento do Cancro (ProtoTera) que tem como objetivo conseguir dinamizar as várias frentes: o projeto do centro, a formação de recursos humanos e a investigação”. Dando a conhecer algumas das ambições desta Associação para este centro, o professor Mário Pimenta terminava frisando que este é de facto um “grande desafio”, mas que permitirá a Portugal destacar-se ainda mais nesta área, colocando o conhecimento que existe ainda mais ao serviço da sociedade.
Através da apresentação de Inês Ochoa, investigadora na Columbia Umniversity, foi possível perceber um pouco mais sobre Física de Partículas e alguns dos desafios que existem na área, nomeadamente para continuar a explorar os limites da fronteira da energia. Por sua vez, José Antão, Industrial Liaison Officer (ILO) da Agência Nacional de Inovação(ANI), expôs aquela que tem sido a relação do tecido empresarial português com o CERN apontando algumas das potencialidades de negócio que residem nesta nova estratégia. Já João Seco, investigador no German Cancer Research Center -DKFZ, conduziria a audiência numa viagem pelas vantagens da terapia de protões, demonstrando o que a torna bem-sucedida e alertando para uma necessidade cada vez mais premente de um centro de Proto-Terapia em terras lusas. “Em Portugal existe um número muito grande de casos de cancro. Cerca de 50% desses casos iriam beneficiar da terapia de protões”, frisou o investigador. “Esta terapia oferece uma significativa redução dos efeitos secundários e isso permite concentrar e aumentar a dose de tratamento no tumor e ainda aumentar a qualidade de vida dos pacientes”, garantia ainda.
Chegaria depois um dos momentos mais aguardados do evento: a intervenção de Fabiola Gianotti, diretora-geral do CERN. Começando por apontar algumas das questões que estão pendentes na área de Física de Partículas, a diretora-geral do CERN reforçava a ideia de que para a resolução das mesmas é preciso “futuro, aceleradores de partículas mais poderosos, entre outros esforços”. “Esta atualização da estratégia deve ser implementada para assegurar a liderança científica e tecnológica contínua da Europa”, sublinhou. Fabiola Gianotti frisava ainda que sendo a Física de Partículas uma área global “a implementação desta estratégia deve prosseguir em forte colaboração com parceiros globais e áreas vizinhas”.
Não faltaram largos elogios à colaboração portuguesa na intervenção da diretora-geral do CERN, que destacou a “abordagem muito equilibrada entre contribuições da comunidade científica no CERN” e “as relações industriais muito boas”. Definindo a atualização da estratégia como “visionária” e “ambiciosa”, “mas também realista e prudente”, Fabiola Gianotti reiterou que a mesma lança as bases para um futuro brilhante para a “Física de Partículas no CERN e na Europa, dentro do contexto global”. Além de permitir à Europa manter o papel de liderança nesta área e nas tecnologias de ponta relacionadas, para a líder do CERN este novo plano proporcionará “grandes oportunidades às economias dos Estados-Membros e às suas indústrias”.
O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, não conseguiu marcar presença no evento, e por isso a sessão de encerramento ficou a cargo do presidente do Técnico, do presidente da Câmara de Loures, Bernardino Soares, e da presidente da FCT. A professora Helena Pereira foi a mensageira escolhida pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para transmitir o orgulho no passado e presente desta ligação portuguesa ao CERN, mas também de esperança no caminho que se segue. “Um futuro que se quer mais interveniente em todos os campos, mas com um foco especial no tecido empresarial que pode agora agarrar estas novas oportunidades de colaboração com o CERN”, referia a presidente da FCT. “O tema das aplicações à saúde merece também toda a atenção do ministro Manuel Heitor, e estamos todos muito empenhados em que este projeto concretize”, transmitia ainda. Referindo a importância de cativar financiamento para que este projeto do centro de proto-terapia “se torne o mais rápido possível uma realidade”, a professora Helena Pereira frisava ainda a ideia de “que todos ganharemos se conseguirmos instalar em Portugal uma infraestrutura destas em benefício da sociedade e também da comunidade científica”.
A discussão em torno da atualização da estratégia europeia para a Física de partículas em Portugal será prosseguida em setembro, numa sessão que reunirá toda a comunidade científica no Centro de Congressos do Técnico, tal como anunciou o professor Mário Pimenta.