A cerimónia de entrega do Prémio Maria de Lourdes Pintasilgo é, ano após ano, uma homenagem ao sucesso das mulheres, e esta segunda-feira, 6 de dezembro, não foi exceção. Lembrou-se a engenheira que dá o nome ao galardão e a admiração que a sua ousadia suscita, brindou-se- com palavras – à excelência e à capacidade de contornar estereótipos, mas também se apontou o caminho que falta percorrer rumo à igualdade de género e a necessidade de que todos e todas se envolvam na caminhada.
O Salão Nobre foi o palco da cerimónia de entrega do prémio às vencedoras da 5.ª edição: Helena Pereira, na categoria de Role Model, e Maria Teresa Parreira, na categoria de Young Alumna. O evento reuniu amigos e familiares das premiadas, mas também docentes, investigadores, alunos, funcionários, e várias personalidades do mundo académico e empresarial.
Maria Teresa Parreira mostraria na sua intervenção como o futuro da Engenharia está bem entregue. Seguindo o que lhe ia no coração, levada pelo improviso e embalada por uma profunda humildade, a galardoada exprimiu a honra de ser agraciada com este prémio, realçou a admiração e a inspiração que encontra no percurso de Maria de Lourdes Pintasilgo.
A alumna fez questão de destacar a beleza da cerimónia que honra um percurso académico e profissional, mas sobretudo que coloca o foco num “dos temas que considero mais fraturantes na sociedade”. “Não nos podemos reclinar nas nossas cadeiras e dar palmadinhas nas costas, pensando que o progresso já está a ser feito na direção certa e que não precisa de nós, porque precisa. A participação ativa de todos para acabar com a desigualdade de género é importante, essencial e todos temos um papel”, vincou.
A forma como começou a sua carreira, os ensinamentos que retirou das várias experiências profissionais que teve, e aqueles que marcaram o seu percurso, nomeadamente os estudantes que ensinou e orientou, não foram esquecidos na alocução da professora Helena Pereira.
A dimensão e o mérito da carreira da alumna tornavam-se mais óbvios à medida que a sua partilha prosseguia, ainda que a mesma fosse sempre feita em tons de modéstia e muita simplicidade. “Não posso deixar de referir o enorme privilégio que é dirigir a agência nacional de financiamento para Ciência e Tecnologia e assim participar na construção do sistema científico em Portugal e melhorar a sua posição em termos internacionais, continuando o percurso fantástico de crescimento que temos vivido na Ciência desde há 30 anos”, disse, lembrando que apesar da evolução há ainda trabalho a fazer. “O grande desafio situa-se hoje no amadurecimento organizacional e densificação de estratégia, assim como na ligação entre os setores da Ciência, Ensino Superior, empresas, administração, valorizando o conhecimento e aplicando-o na sociedade”, referiu.
A presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia terminou declarando que sempre gostou “de ensinar, orientar, investigar e gerir”. “Se eu puder ser modelo para alguém sê-lo-ei certamente porque é com gosto que trabalho e com genuíno interesse pelo que vai acontecendo”, disse.
Professor Rogério Colaço: “A igualdade de oportunidades entre géneros é ainda caminho a percorrer e não destino alcançado”
Na abertura da sessão, o presidente do Técnico , professor Rogério Colaço lembrou o “currículo brilhante” e o “legado histórico, cívico, político e humano” de Maria de Lourdes Pintasilgo, salientando os seus inúmeros feitos, e o facto de nunca se ter acomodado “ao destino que a sua condição de mulher lhe reservava”.
Evocando alguns dados estatísticos e exemplos concretos que demonstram bem a necessidade de continuar a dinamizar iniciativas que promovam a igualdade entre homens e mulheres, o professor Rogério Colaço frisava que “a igualdade de oportunidades entre géneros é ainda caminho a percorrer e não destino alcançado”.
Também a professora Beatriz Silva e o professor Alexandre Bernardino, coordenadores do grupo Gender Balance@Técnico, realçariam a sub-representação das mulheres nas áreas das Ciência e Tecnologia, Engenharia e Matemática (CTEM). “O maior envolvimento das mulheres nas áreas CTEM é essencial para abordar os atuais e complexos desafios da nossa sociedade através de maior diversidade de talento e maior equilíbrio na identificação das necessidades globais”, afirmou a docente do Técnico, retirando em seguida que “sem medidas ativas para acelerar este processo a mitigação total do estereótipo de género levará ainda muitas gerações”.
Ao recordar os percursos de sucesso das engenheiras que o Prémio Maria de Lourdes Pintasilgo distinguiu ao longo destas 5 edições, o professor Alexandre Bernardino defendeu a importância de destas referências femininas “para que as nossas jovens saibam que estas áreas abrem muitas possibilidades de carreira mesmo em áreas tradicionalmente vistas como inacessíveis às mulheres”. “É esta a missão que o prémio Maria de Lourdes Pintassilgo pretende cumprir: que todas as futuras engenheiras possam ambicionar a concretização dos seus sonhos sem limites nem preconceitos”, afirmou.
Filstone patrocina Prémio Maria de Lourdes Pintasilgo
Miguel Goulão, administrador executivo da Filstone, fez questão de explicar à audiência o porquê de uma empresa ligada ao setor extrativo se ter associado ao prémio enquanto patrocinador. “Somos uma empresa que há 4 anos não tinha no seu processo produtivo nenhuma mulher. Hoje dos 221 colaboradores que temos já no processo produtivo, 39 são mulheres”, afirmou. “O nosso desejo é chegar à paridade. Posso-vos testemunhar que o aumento de produtividade da empresa foi de tal ordem com a introdução deste género na nossa empresa que não podemos deixar de reconhecer que este tipo de iniciativas nos ajudam no processo de introdução do género feminino em empresas que têm um forte pendor masculino nos seus quadros”, complementou.
Para o líder da Filstone, a “desigualdade das mulheres no mundo deveria envergonhar todos no século XXI”. Reproduzindo dados das Nações Unidas que indicam que mais de uma em cada três mulheres experimentará a violência de alguma forma durante a sua vida por serem simplesmente mulheres, o administrador afirmou que “isto não é apenas inaceitável, revela uma incrível falta de inteligência”. “Por isso, todos somos poucos na ajuda a esta causa, e estamos, sem dúvida, todos convocados”, rematou.
Leonor Beleza e Manuel Heitor destacam importância do galardão
A alegria com que recebeu o convite para participar nesta cerimónia foi várias vezes evidenciada pela doutora Leonor Beleza, presidente da Fundação Champalimaud. Ao longo da sua intervenção explicou que esta satisfação está relacionada com três razões particulares: a natureza deste prémio que pretende provocar alterações no paradigma da desigualdade de género; a homenageada no nome do prémio com quem teve o prazer de privar e por quem nutre uma profunda admiração; e também com uma das agraciadas, a professora Helena Pereira, que faz parte da sua geração, com quem se cruzou por diversas vezes no percurso profissional e “cujo notável percurso profissional académico e científico” fez questão de evidenciar.
A presidente da Fundação Champalimaud assinalou que “a questão não é só se há muitas mulheres e em que posições é que estão a investigar, a questão é também se como objeto de investigação as questões de sexo e de género são ou não meditadas como precisam ser”.
O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, professor Manuel Heitor, afirmou não ter dúvidas de que “evoluímos muitos e hoje somos uma sociedade mais igual do que éramos certamente há muitos anos”, no entanto, realçou que “também não nos devemos contentar com isso”. Pegando nas palavras da alumna Maria Teresa Parreira, defendeu “que devemos continuar muito zangados e continuar sempre a fazer muito mais, porque não temos feito o suficiente”.
O governante destacaria a relevância deste galardão no reconhecimento de percursos femininos de sucesso, sublinhando “que a desconstrução da desigualdade do género é um processo social particularmente complexo” e que o debate em torno desta temática exige cada vez mais profundidade.